Histórias velhas para um ano novinho em folha

8.1.14 Unknown 0 Comentarios


Antes mesmo de começar o falatório, caberia uma pergunta: - porque começar 2014 com uma história que me ocorreu num tempo pré-diluviano?

A primeira resposta seria a da falta de assunto ou de criatividade do cronista, que se encontra ressacado ainda das festas de fim de ano. Plausível. Outra, no entanto, sugere que botar os pés no novo ano com uma historieta desse naipe é um vaticínio, um alerta. Juntemos o útil e o agradável e fiquemos com as duas.


Há uns catorze anos (ou mais) atrás, no dia do aniversário da minha mãe, calhou de eu estar junto dela no momento em que ela atinou que, por mais que o dia fosse de festa, o pão e ovo da mesa não podiam faltar - qual seria o desjejum da ressaca no dia seguinte?


Nessa época eu já era famoso por algumas proezas – que minha chamava de demências – na (aparentemente) simples tarefa de comprar algo no mercadinho mais próximo e voltar. Assim, sem percalços.  

Esquecer o que deveria ser comprado e voltar no meio do caminho para casa para refrescar a memória, ocorria demais, ocorria sempre. Comprar errado, esquecer um ou dois itens da lista, também tinha uma considerável recorrência. Mais raramente eu perdia o dinheiro, raro, mas já tinha acontecido.


Sabendo desse meu vasto currículo, minha mãe, junto com uma nota de 50 reais – bicho, 50 reais naquela época! -, me deu um sermão desgraçado, me botou o maior medo, e exigiu que eu chegasse em casa com a compra devidamente feita e com o troco completo.


Não fosse essa pressão psicológica, eu não teria colocado o dinheiro no cós da bermuda, por achar que sentindo ele seria mais difícil perdê-lo. Na ida, tudo blue, na América do Sul. Na volta, já na altura da rua de casa, quando eu pensava que o time estava ganhando de goleada, dei por falta dos quarenta e tantos reais e das moedinhas. Puta que pariu! - exclamei. Me fudi – lamentei, logo na sequência.


Não podia chegar em casa sem aquela pequena fortuna. Comecei a refazer o caminho diversas vezes, todas elas olhando um determinado ponto que eu não tinha examinado ainda, em busca daquelas cédulas. Não teve jeito, não achei. Desastre. Tragédia.


Já tinha andado muito. Na certa, em casa, todos já estariam dando pela minha falta, e preocupados até. Eu estava cansado, os ovos já estavam quebrados de tanto resvalar nas minhas pernas, o pão estava amassado, a noite caía. Não tinha saída. Teria que voltar para casa, explicar tudo e, caramba, enfrentar a fera.


Foi o que eu fiz, e não sem uma tonelada de medo e outra de vergonha sobre os ombros. Como previsto, minha mãe se enfureceu. Ira, cólera, raiva, ódio – todas essas são palavras bonitinhas para descrever o que ela sentiu. Ela ficou foi puta da vida mesmo! Se eu não fosse seu filho, era capaz de me jogar no rio mais próximo.


Mas depois do vendaval de palavrões – que minha vó define certeiramente como pisa de língua -, era chegada a grande hora, a do cacete, a do pau, a da porrada propriamente dita. Eu já chorava de véspera, quando, do céu, minha tia, que passara o dia todo lá em casa ajudando minha mãe, interviu – e não é que ela conseguiu conter a fera?-, me salvando do cinturão de couro e do cipó de goiaba.


Senão fosse ela (ah, se todos no mundo fossem iguais a você, tia), eu teria levado um pito daqueles inesquecíveis. Grato!


E a moral da história para o ano recém-chegado? Moral, não arriscaria. Mas sugestões, tenho algumas: siga à risca as orientações da sua mãe, evite andar no mundo da lua, tente ao máximo manter sua atenção e sua concentração, jamais guarde dinheiro no cós das calças – e, se nada disso der certo, reze para ter uma tia brodági ao seu lado.

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