Sobre os pensamentos errantes e inoportunos
E quando os dias de calmaria se forem, você olhará para a foto e
sentirá um misto de saudade e alegria ou permanecerá inerte tentando
compreender, confusamente, o que aquela imagem traz à tona? Já não temos tanta
disposição, dirás não sem razão, e também não possuímos tempo hábil para perder
em divagações tolas e infrutíferas. Que há de interessante nessa empreitada
estapafúrdia de tentar entender o futuro — é essa a questão que você me coloca.
Simples pergunta: — há algo aí de produtivo?
Prossigamos.
Dos muitos
pensamentos que me tomam nessas horas entediantes em que eu fico em casa
esperando você regressar do trabalho, muitos deles são inférteis, admito,
outros não são nada que possa classificar e há ainda alguns muito peculiares
que depois de me consumir horas a fio, subitamente, partem. E depois retornam.
Retornam sem explicação. Sem legendas. Sem ressalvas. Sem porquês.
Mas, ora, se retornam, o fazem
com algum propósito. Se há propósito, mesmo que não explícito, há “algo” que
neles residem. Talvez não o “algo” que queiras e procuras, o algo prático e
pragmático que nos ponha, uma vez esclarecido, em outro patamar de entendimento.
Mas, certamente, há qualquer coisa da qual possamos nos valer.
Mas penso, novamente naquelas
referidas horas maçantes em que me pego contemplando o extasiante espetáculo
que é o farfalhar das folhas, e acho que localizo um ponto no qual possamos
galgar algum “entendimento”. E o entendimento principal é: - não há que ter
entendimentos. Não há que ter perguntas acompanhadas de respostas. Não há que
buscar o que é produtivo. Essa busca, sim, é inútil. Isso a que chamamos
producente, um algo com o qual valha a pena perder tempo, só vem à custa de
nossa secura.
Mais que a secura dos olhos
provocada pelo psicoativo. A secura de vidas regulares, constantes e lineares,
que não são capazes, por si só, de pôr em água nossos olhos. E isto, a menos
que se sacrifique aquele pouco de sinceridade indispensável ao convívio, não é
uma divagação, não é uma fantasia, uma imagem furtiva. Você sabe que não é. Mas
não sabe o que, de fato, é. Eu te ajudo: são ridículas e risíveis angústias. E
já que você veio até aqui comigo, é com você que eu compartilho aqueles dias em
que a gente se sente como quem partiu ou morreu. É em você, pois, que eu
deposito minhas angústias.
Haverá bebida que dilua tamanha
aflição? Não sei, a noite começou agora.
Prossigamos.
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