Oitavo Monólogo: (para lembra que o mundo nos fadiga) Patrício: Jovem. Irritado. Veloz.
Patrício tomou
seis garrafas de vinho barato no bar de Luco, pagou a conta e caminhou em
direção a sua moto, que estava estacionada em frente ao estabelecimento etílico.
Talvez, amiga leitora, amigo leitor, você não tenha noção do impacto que gera
em nossos sentidos, tomar, sozinho, seis garrafas de vinho barato; mas eu, que
já me embriaguei até quase morrer centenas de vezes, sei bem como Patrício se
sentia. Montou na moto, colocou os fones de ouvido que estavam conectados ao
seu celular e partiu. Começou a tocar Rock
and Roll do Led Zeppelin,
eletrizando Patrício:
It's been a long
time since I rock and roll
It's been a long time since I did the stroll
Let me get it back, let me get it back
Let me get it back, baby, where I came from
It's been a long time, been a long time
Lembrou da briga que teve com sua namorada
naquela noite “Vá se foder, Suzana, vá se foder e faça o que você quiser, se
der pra gente continuar ótimo, também se não der foda-se”. A música continuava:
Been a long
lonely
Lonely, lonely, lonely
Lonely time
Yes, it has
Lembrou do patrão que lhe dera um puxão de orelha já bem perto da hora
de largar “Aquele filho da puta pensa que é esperto... O cara com a minha idade
e pensado que é mais vivo que todo mundo, otário!”. A música empolgava:
It's been a long
time since the book of love
I can't count the tears of a life with no love
Carry me back, carry me back
Carry me back, baby, where I came from
It's been a long time, been a long time
Been a long lonely
Lonely, lonely, lonely
Lonely time
Acelerava a moto e ganhava velocidade pela madrugada e pela avenida.
Lembrou da piada que o colega de trabalho lhe soltou no canto do escritório por
ele ter levado o esporro do patrão “Deonildo! Cuzão! Babão! Babão do chefe! Merece um murro
na cara!”. A música acelerava junto com ele:
Seems so long
since we walked in the moonlight
Making vows that just can't work right
Open your arms, open your arms
Open your arms, baby, let my love come running in
It's been a long time, been a long time
Lembrou que a avenida tinha sido recapeada durante a semana e que os
quebra-molas ainda não tinham sido recolocados. Acelerou. Lembrou de uma pilha
de coisas que detestava e teve vontade de mandar o mundo para a puta que o
pariu. Disse a si mesmo “Dá vontade de acelerar pra sair correndo desse mundo
merda”. Patrício voava em sua moto e mais a frente o sinal estava prestes a
ficar vermelho, mas era madrugada: sem pessoas na rua, sem outros veículos, só
o sossego da noite. “Vai dar tempo” pensou Patrício “Ninguém à vista... Apenas o sossego”. Patrício
quase voava despreocupado. O sinal acabara de entrar no vermelho e de um dos
cantos da encruzilhada um automóvel surge, e sem tempo pra desviar, Patrício
acerta a lateral dianteira do veículo. O impacto arremessa-o pelos ares em
direção ao chão, metros a frente. “Não!” pensou ele, usando o que lhe restava
de vida. Patrício não estava de capacete, queria o vento fresco da madrugada em
seu rosto. A violência do acidente só encontra melhor retrato se imaginarmos
que aconteceu com a cabeça de Patrício o que aconteceria com um saco de papel cheio
de ovos que fosse arremessado violentamente contra a parede. O celular não foi
afetado pelo impacto e ainda tocava os últimos segundos da música:
Been a long
lonely
Lonely, lonely, lonely
Lonely time
Lúcio, um mendigo do bairro, viu a cena de
longe e correu para tentar ajudar. Tarde demais.
Been a long lonely
Lonely, lonely, lonely
Lonely time
Castanha 01 de junho de 2014
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