Palavras dispersas, desejos concisos

27.9.12 Joarez 2 Comentarios


                                              "A gente foge da solidão quando tem medo dos próprios pensamentos." (VERÍSSIMO, Érico)

Eu quero viver contigo, nos dar quatro filhos, morar numa casa grande, com o muro tomado por trepadeiras, viajar até a Sibéria. É o que quero, o que acredito. Mas se os quatro filhos não vierem, teremos três, ou dois. A casa pode nem ser tão grande, ou pode, até mesmo, ser um apartamento. Se não formos até o frio enlouquecedor da Sibéria, nos contentaremos com a Suécia, que nada!, nossos narizes estarão congestionados do mesmo jeito. A precisão não importa, esses planos servem unicamente para nos manter juntos. Eu não vou deixar que o ideal me fruste, nos fruste. Eu não vou negar a minha vida, o que me cerca. Eu vou ser feliz contigo. Do mesmo jeito que sou hoje, aqui, deitado, sem cigarro e sem poesia, nessa cama fria.

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Breves considerações sobre Literatura e Redes Sociais

23.9.12 Joarez 2 Comentarios


                                                                                       "Texto de título pomposo, mas de alcance ordinário" (MESMO, Eu)

Tente agora, ou daqui a alguma tempo, olhar o seu próprio perfil no facebook, a rede social do momento. Uma tarefa tão trivial como se olhar no espelho antes de sair casa, mas que passa tão desapercebida como a mesma. Certo, depois de redobrar a atenção, sigamos. Pergunta-se: será que você é reduzido (a) àquelas informações furtivas de caráter tão superficiais?; será que toda profundidade de sua personalidade cabe numa rede social que, no máximo, quer saber no que você está pensando agora?

Certamente, não. Pode-se dizer que o facebook é um espelho, não daqueles que alemejam ser fiéis, mas daqueles outros que deformam e comunicam apenas uma caricatura. Não esqueçamos que o facebook é uma invenção de um jovem socialmente castrado segundanista de Havard. Então, tudo aquilo que o fêicebuque "pede" de você é: no que você está pensando?; com quem com você estava?; aonde estava?; tem foto?!, vamos, poste uma foto!

Eis o que quero dizer (em termos sintéticos): o fêicebuque estabelece um tipo de interação supericial, rasa, aparente, falsa, leviana. Daí que nos pegamos, muitas vezes, em situações grotescas, como, por exemplo, na ocasião de nosso próprio aniversário, quando uma pessoa poucas vezes vista, e há muito não vista, posta na sua "linha do tempo": fulano, TUDO de bom pra vc, saúde, sucesso e felicidade! ABÇ FOOORTE! Nossa, um calor e energia que nossos três encontros rápidos e desinteressantes não deixaram transparecer; ou como vemos em páginas de pessoas que já morreram: amigx, que você se de bem neste momento. fica na PAZ! Xêro! Na certa, aguarda resposta.

E a literatura, que tem a incrível capacidade de encantar, não apenas, de conectar, digo, de interagir virtualmente, acaba sendo mutilada, e virando, não mais o encadeamento pensado de palavras com a virtude de seduzir e maravilhar, mas uma postagem - uma simples atualização de status. Disso se segue que a interação com ela vai se dar no mesmo nível. Estaremos recortando Clarice Lispector para postar, compartilhar e curtir irrefletidamente. As palavras de um poema de Drummond são mais algumas na gritaria silenciosa que é a sua timeline: curtiu, clicou na barra de rolagens, opa, já era.

Na certa tu, raro(a) leitor(a), a esta altura, já estás me colocando na vala dos elitistas culturais, que acham que a literatura é uma coisa sagrada, intocada, e etc, etc... Mas, não, sinto informar que não. Muito pelo contrário: sou a favor da literatura no campo da internet por considerá-la o espaço mais fértil para crítica. Isto aqui é apenas um esforço, e um esboço, na direção de refletir sobre como as ditas novas mídias se relacionam com a literatura - e com nós mesmos, por que não?

Sendo assim, acrítica e irrefletida, caricatural e mutilada, a relação que a grande rede social da vez funda conosco, estaremos, querendo ou não, sendo vítimas de seus desdobramentos bizarros, como a história da menina que postava página de Caio Fernando Abreu no fêicebuque e não sabia que ele tinha morrido. Será essa a última instância, o ponto culminante, de nossos desejos?

Aguardemos as posteriores redes sociais, digo, os capítulos subsequentes.

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Azáfama e cansaço em um recado

19.9.12 Pássaro Bege 5 Comentarios



Se for pra falar merda, o Pássaro bege aqui não arrega, e vai cagar também. Dia desses, tinha um grilo no meu banheiro e taquei “Detefon”! Pronto, peguei intoxicação pelo cu! Tô virado num mói de coentro, com um fastio cabuloso, desses de ficar-se um vara-pau em três horas.
Vá se fuder, rapaz! Que porra é essa!? De uma hora pra outra, todo de terno, desconhecendo os irmãos, chamando urubu de meu louro... A conversa tá quente, compadre! Toma tua cachaça na paz e vai cantar de galo em outro terreiro, tá ligado!?
Tais pensando que a vida é mole, é!? É não, João. Compra teus R$ 2,00 de pão de Francês e vaza, antes que eu perca a lucidez! É só um recado, não é mais nada que isso! 
Semana que vem nós conversamos melhor, quando tua cachaça cair e a lombra arriar, porque hoje estou por demais cansado. Ando trabalhando, né pai!? Correria irmão! Afã! Azáfama!!! Sabes o significado!?



Por: Pássaro bege

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O delírio

17.9.12 Castanha 1 Comentarios



O nome do sujeito era Alexsandro (digo que era porque ele já morreu), mas, depois de um tempo começou a ser chamado de Vila-Rica. Bom sujeito. Tomei muita cachaça com ele. Era meio agoniado, falava rápido e era um tanto exagerado: Bebia muito, discutia muito, fumava muito, ria muito e tantos outros muitos. Nasceu no dia de Tiradentes, um dos muitos 21 de abril que já existiram, mas não era revolucionário, apesar de ser militante do PT, tampouco arrancava dentes, nem dele nem dos outros, e também não era rico, como dizem que Tiradentes era; (irônico: Vila Rica é o nome de uma cidade de Minas Gerais – Estado onde Tiradentes rebelou-se - e é também o nome de um bairro da cidade de Jaboatão e foi por frequentar muito esse bairro que Alexsandro passou a ser chamado de Vila-Rica e Vila-Rica nasceu no dia de Tiradentes e morreu quase que no mesmo dia, só que vinte e poucos anos depois de nascer, e só agora, escrevendo essa crônica, eu percebi isso... mas, deixa pra lá). Estou escrevendo porque dias atrás aconteceu uma coisa muito estranha e que é tão verdadeira quanto as crônicas de um escritor que gosta de inventar histórias. Era sábado 21 de abril, estávamos num bar conversando muito sobre muitas coisas e nos lembramos de Vila-Rica (da cidade não, – tampouco do bairro - do nosso amigo) e em seguida lembramos que se ele estivesse vivo estaria comemorando aniversário (como eu tinha dito, Vila-Rica morreu: Não foi de fome - apesar do médico dizer que foi de anemia – e não foi de pobreza – apesar dele morar num casebre – foi de desgosto). Contamos histórias dele, rimos bastante e fomos embora. Na madrugada acordei ressacado com dor de cabeça e sede, levantei pra mijar e tomar água; quem eu encontrei na sala, sentado no sofá? Meu Amigo, Vila-Rica! Fiquei pasmo, mas ele me acalmou:
 - Deixa de frescura Helton, terror dos mortos é coisa de Hollywood. Além do mais eu tenho pouco tempo. Tem alguma coisa aí pra beber?
- Água? - perguntei.
- Água não, Helton! Tu acha que eu vim tomar água?!
Peguei uma garrafa de vinho que estava na geladeira - meia garrafa -, um bom vinho, que era também um vinho barato, (digo que era porque não existe mais, foi tomado). Enchi dois pequenos copos, entreguei um a ele e começamos:
- Como vai meu amigo? – perguntei.
- Vai indo, nada de novo com a morte.
E eu meio estúpido e meio atônito:
- Tem feito o que ultimamente?
- Muito pouco, a morte é assim e assim...
- Tem muita coisa lá? Muita coisa que não tem aqui?
- “Lá”? Não é “Lá”. A morte não é o “Lá” nem o “Aqui” a morte não é “Lugar” ela é o “Não-lugar”. Não existir é muito mais sossegado que a agonia de viver; isso aqui, estar vivo, é não saber nunca o que vai acontecer no segundo seguinte, se angustiar e mesmo assim ter medo de perde a vida.   
Alguns segundos de silêncio até que perguntei:
- Dá pra falar mais desse “Não-lugar”?
-Não dá não, tenho que ir. Obrigado pelo vinho e pela conversa. Só lamento você não ter me dado os parabéns pelo meu aniversário, que foi quase hoje.
Sorriu, colocou o copo sobre a mesa da sala, girou a chave da fechadura da porta, abriu-a e foi embora caminhando com passos leves.
Fiquei pensando: Esse Vila-Rica é uma figura. Que delírio esse dele: “Não-lugar”! Onde é que já se viu uma coisa dessas, isso não existe...




Castanha 25/04/2012        

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