Escaleno

26.12.13 Pássaro Bege 0 Comentarios


No passo em que daquela de longa data eu me afastava, desta que agora surgia eu me entregava sem pestanejar. Porquanto eu tivesse a sabedoria daqueles que caminham reflexivos, pouco me valeu as ressalvas e as travas que chegam com a maturidade, e quando dei fé, já estava subsumido ao seu enlace. Foi dali, com os olhos vidrados, que pude perceber no seu cansaço o seu viço numa canídea voracidade.  
Era tarde, quase três, sendo assim, tive de ir, sem dizer que havia pouco espaço pra fazer um ninho na casa onde havíamos nos encontrado. Só depois do caso passado bateu aquela saudade do dormir, da voz mal acordada, das histórias; um tipo de saudade meio mal arranjada, saudade daquilo que não viria; saudade daquilo que jamais chegara.
Fui ao beijo de despedida sóbrio, visto que das redondezas tudo me espreitava: os móveis, os hóspedes, o relógio da parede e uma pia cheia de louça suja. Foi então que, na quebrada entre os lábios e o vinco de uma de minhas bochechas, rosaram-se buço e barba; fogo e calma, e num instante, dessa métrica não parnasiana emergiu  
                                                          
                                                             a escada,
                                                               o táxi,
                                                 a velocidade, e por fim,

       minha solitária casa, um papel, uma caneta e dois cigarros amassados na carteira. 

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Corta pra 2014

24.12.13 Unknown 0 Comentarios


Às vezes eu penso que a vida, pra gente que preenche os quatro pês referidos por Miró, é uma partida de xadrez contra um computador com processador i3: quando você começa, tem bilhões de possibilidades à frente, mas não importa o que aconteça, não importa, repito, você vai, invariavelmente, perder - cavalo na casa c3, bispo na b5, tá armada a arapuca e em dois lances, zap, já era a sua dama.

Claro que a linguagem da vida não é assim tão simples, aliás, tão exata e lógica, como a do xadrez. E é por isso que muitas pessoas (aquelas mais abastadas) gastam uma fortuna com análise, para que num entremeio, num vacilo de entrelinhas, algo significativo venha à tona: "eu estava na praia hoje, doutor, e voltei para casa quando meu filho me chamou para jogar pênis..." - Arrá!, você disse pênis e agora seu analista sabe que você é um marmanjo velho mau castrado que parou na fase fálica.

Tá bom, também não é assim tão simples. Mas o exemplo serve para ilustrar e divertir.

Mas eu comecei essa crônica falando da vida e um cronista que começa uma crônica versando sobre o clichê "vida" merecia um apedrejamento em praça pública. Mas poupem essa pobre alma. Eis, enfim, o que eu quero dizer, agora sim, e aqui faço dois pontos: porque sempre tem um infeliz, nessa vida, pra testar sua fé?

Mermão, pegue leve, fique na sua. Faça como a sabedoria popular ensina: não mexa com quem está quieto. O pior é quando se escondem atrás de outras coisas, se escoram, e você, pobre alma corroída pela raiva, não pode enfiar-lhe uma mão no meio das fuças nojentas. E outra, e outra, e outra, e outra, até que essa pessoa aprenda com quanto paus se faz uma canoa.

É por esses acontecimentos, e outros semelhantes, que eu acho que esse ano de 2013 já deu. Já deu demais, vá simbora, arrume suas trouxas e saia calado. Não sou, também, assim tão ingrato. Agradeço o que me foi dado de bom. Relevo as fuleiragens, vá lá, faz parte do jogo. Mas este fim de ano já foi conturbado demais. Espero que o ano vindouro me dê muitas alegrias e que eu possa crescer como pessoa, essas frescuras que as pessoas falam nessa época do ano, paz, prosperidade, que eu possa virar alguém, de fato, glande...

Vixe!, eu disse "glande"? Deus do céus!

Corta pra 2014, rápido.

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Blues incensado (ou Direito de fumar)

23.12.13 Foi Hoje! 0 Comentarios



Pensem num acorde menor!

11:20 da manhã de uma quinta feira! Sol escaldante, o pó da estrada embota minha visão, o calor derrete minhas linhas de raciocínio e não consigo mais pensar em outra coisa a não ser a parada de ônibus. Eis que, no meio do caminho, sou interpelado por uma mulher. A priori não consegui identificar que era uma mulher, pois estava de cabeça baixa e vi suas pernas cabeludas, seus passos atravancados por uma saia jeans apertada na altura dos joelhos cinzentos – logo pensei que tipo de homem é esse? Quando levanto a vista, vejo um bigode. Juro que não era um buço, isso é uma coisa gentil que as francesas – as cortesãs do Sol possuíam. Deveras, aquilo eram bigodes mesmo. Os cabelos presos, um rosto quadrado e uma voz forte gritando maldições colossais: “Esse cigarro vai lhe matar”! Deus tá vendo e não se agrada disso.

O sol estava escaldante e minhas ideias não estavam no lugar de sempre, logo pensei “creio que Deus tá vendo esse assassino chamado cigarro que quer me matar e deve estar muito aborrecido com ele”. Pensei, pensei novamente e fiquei calado. Segui para meu destino, que já havia se modificado. Agora eu iria ao metrô.

Logo saquei outro cigarro e tratei de acendê-lo no estilo chegada ao bar ou ainda pós-coito. Abri rapidamente o maço de cigarros, joguei levemente para cima e pressionei o primeiro cigarro sobressalente. Coloquei na boca, fechei um olho, puxei a caixa de fósforos, ascendi e não dei a primeira tragada – pois o gosto do enxofre do fósforo é horrível- soltando nicotina para o meio ambiente, soltando pensamentos, liberando coisas boas e ruins. Continuei a caminhar e a fumar, a fumar e a caminhar. Continuei a ser quem sou, pois minhas ideias e pensamentos mudam – com o sol forte eles somem – mas eu não mudo com a mudança deles.

O ato de fumar é mais que necessário. É bom pra caminhar, é bom para ser – pois ser é ser percebido – é bom para pensar, é bom para escrever. Também é bom para fazer amigos, sem contar que é bom para fazer sexo.

E a música com o acorde menor chama-se “Direito de fumar”. Querem tesourar o meu direito de fumar, tabaco minha sina fumo em qualquer lugar, fumo na sua casa, na igreja ou no caixão.

Mais um cigarro?


por: João Berimbau

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Rosário de ódio

23.12.13 Cabotino 1 Comentarios




Querido Papai Noel,

Primeiramente, quem fala aqui é uma criança ressentida que cresceu de início te amando, mas que depois enxergou a sua real dimensão quimérica e elitista.

Quero que saibas de antemão, eu não gosto mais do Senhor e torço para que você capote com suas renas em alguma curva do céu boreal, ou quem sabe, colida na ponta de um iceberg e que seu corpo fique submergido nas águas gélidas do cálculo frio e egoísta da economia política que tanto alardeias. 

Também desejo que fiques entalado em uma chaminé, e que alguém a desentupa ateando fogo na lareira só para ver toda a sua cútis branquíssima ficar da cor do seu uniforme da Coca-Cola.

Torço para que você caia em meio aos corações partidos dos meninos e meninas que não visitastes nas vésperas de Natal em todo o mundo. Os que você deixou à míngua com os olhos rasos d’água esperando-te como uma promessa nunca cumprida - a inocência construída e roubada por sua imagem.

Sei que sua sacola está cheia sonhos pilhados; de brinquedos fantasmagóricos; de bicicletas sem rodas e de cartões de Natal endereçados ao nada. Sua sacola não tem fundo e tragou tudo o que uma criança tem de mais precioso, a crença nos adultos.

O Senhor é um velhinho mau. O Senhor tem um coração de gelo.

Bater em sua porta é bater na porta de um surdo e suas renas são alimentadas com o mesmo pasto que alimenta às desilusões.

Sua longevidade é fruto de uma lógica que almeja o imponderável e que só socializa as perdas; a miséria; os escombros da guerra e a devastação. Tudo isso alimenta a sua opulência. Sei que sua pança cresce a todo ano às custas da desigualdade; da acumulação e da produção que é coletiva, mas cuja distribuição e a apropriação são para poucos. Você é voraz como um velho glutão que devora sonhos e caga re-a-li-da-de.

Torço que você caia em meio aos pais que tiveram que se desculpar diante de seus filhos porque o presente não veio ou não foi o que eles realmente queriam.

Quantos envelopes selados com os desejos mais ardentes ficaram esperando realização?

Quantos olhinhos semi-abertos esperando por você e que foram vencidos pelo sono ansioso de um corpinho cansado?

Quantos presentes foram procrastinados para um futuro que é feito do mesma matéria que você, ou seja, o inatingível?

Quantas crianças pobres montaram árvores de natal cuja base era uma lata cheia de areia decorada com papel de presente ou jornal; onde a árvore era um galho grande, seco e morto envolvido com algodão para simbolizar a neve e que os presentinhos pendurados nela não passavam de caixas de fósforos envelopadas em papel de presente vagabundo, esperando pelo Senhor?

Quantas crianças comportaram-se o ano inteiro esperando a sua aparição recompensadora, mas o Senhor foi indiferente a todas elas. Em contrapartida, distribuístes aos pobres a amarga espera, o gostinho do, “talvez no próximo ano”.

Sua casa com seus duendes, suas renas e sua esposa são todos convenientes com o seu ideal: aos ricos, tudo; aos pobres, paciência.

Por fim, torço para que você caia ao meu lado porque eu tenho um presentinho para lhe dar.

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"Inbox"

17.12.13 Pássaro Bege 0 Comentarios


Cavalo do cão.
Demônio da garoa.
Lúcifer dos quatro cantos.
Miséria.
Infeliz.
Febre “Tifo”.
Roedor de unha encravada.
Alma sebosa do treze de maio.
Conde da boa vista ao meio dia.
Feroz roedor de isopor.
Cavalgador leproso de léguas inenarráveis.
Altruísta lenhador do monte Everest. 
Contador butanês da sucursal alemã do jornal boca de confusão.
Território inimigo.
Vestes do satanás,
estás aí?



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Sindicato dos Remadores

11.12.13 Unknown 0 Comentarios




Atônita, a velhinha colocava os óculos no rosto para ver a multidão que se aproximava. Estava impressionada: apesar de morar ao lado do rio não imaginava que nessa cidade existissem tantos remadores, menos ainda que a classe fosse organizada em forma de sindicato. De longe, lá vinham eles, empunhando bandeiras e cartazes, entoando algumas rimas, bradavam forte e  determinados. Com algum esforço conseguia-se perceber: o que eles reivindicavam era um rio limpo. Não aceitavam ter que trabalhar se acotovelando com garrafas pet, sofás e TV’s, e cheirando a bosta e o mijo dos moradores dos prédios mais luxuosos da cidade. Estavam decididos, queriam fazer um projeto de lei, não aceitavam só palavra e tapinha nas costas. Auxiliados por um jurista que apoiava a causa, pensaram até num nome para a nova regra que queriam promulgada, com o latinzinho adornativo de costume e tudo, algo como jogae detrictus no lixum. Daí a pouco, a polícia militar, a mando do prefeito, chega para conter a manifestação que as rádios locais até então noticiavam que era pacífica e ordeira. Foi uma contenção regada a cassetetes, balas de borracha, bom de gás e de efeito moral, socos e pontapés, respeitem a autoridade! – e salve-se quem puder. Quando poeira baixou, e o gás das bombas se dispersou, a velhinha, que ainda tentava digerir a pauta dos remadores, se levantou, foi até a beirada da ponte, arremessou o embrulho da jujuba e resmungou: - Mas é cada uma que me aparece!

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Viagem ao fim da metafísica

10.12.13 Cabotino 0 Comentarios



Leia este texto ouvindo, John Coltrane _My Favorite Things[1]

Mandou a tese às favas naquele instante, não aguentava mais olhar para a tela do computador e espremer o seu cérebro entre os apriorísticos platônicos e os arquétipos bachelardianos – se não há ato inédito em suas experiências com mundo, ver é rever, ou não saber é ignorar – como aponta a teoria do primeiro ou se nossa imaginação é guiada pelos quatro elementos – terra, água, fogo e ar – como aponta as últimas contribuições do segundo. Ele pensou: não custa nada rever alguma coisa lá fora e dialogar com alguns dos elementos.

Saiu de seu quarto no 16ª andar de um apartamento na Av. Navegantes e foi comprar cigarro na Select do posto de gasolina aberto 24h na Av. Conselheiro Aguiar. No caminho, trocou saudações com Juju – uma travesti que costumava lhe pedir cigarro e perguntar como estava a vida. Depois parou para conversar um pouco com Magali – uma garota de programa que recebeu este apelido por que dizem que come muito. Fez o comprimento repentino – Diz Maga, como estão as coisas hoje? Movimento bom? Ela respondeu – Aff, que susto carai chega assim sem cerimônia... Sabes que gosto de preliminares e tal e a esta hora aqui em Boa Viagem o mais besta acende cigarro no relâmpago, chegue mais devagar meu querido, caso contrário me cago. Ambos riram e ela continuou – movimento fraco sabe como é dia 18 é foda e, além disso, estamos ainda em aula, bom mesmo é nas férias que os filhos de papai cansam de bater punheta e vem aqui torrar as mesadas... Olha, dê lavrando que vem um carro aí agora em minha direção e se tu ficar por aqui é queimação pra mim, e eu tenho que levar o Ninho pra Gabi mais tarde, vaza! Vaza! Vaza! – Já vou Maga relaxa aí o piu-piu que já vou, cuidado com o miocárdio porque a burguesia recifense até agora não gosta de necrofilia. Riu com a sua piada jocosa e um pouco pernóstica. Ela respondeu – vai, vai, vai e depois tu me diz o que porra é necrofilia.

Depois de comprar o cigarro ele vinha voltando no sentido da praia e Juju que já sabia dos seus hábitos noturnos gritou – Ei filé me dá um cigarro aí. Ele foi andando em sua direção e lhe deu um cigarro e com uma pergunta. – Juju, como estão às coisas hoje por aqui? – Anda fraco gostoso, sabe como é meio de mês, só chega liso por aqui frescando com a minha cara, já sei o caqueado, carros um ponto zero com fumê e uma pá de tabacudo tirando onda comigo. Sei do que eles precisam, mas como não tenho uma rola quadrada fico por aqui de cara fechada. Vou torcer para pelo menos tirar as passagens do resto da semana e uma ferinha na sexta porque tá foda viu. E tu, ainda com a filosofia que te rouba o sono? Cuidado para não endoidar e ficar igual a estes escrotos que vem por aqui à noite arriar comigo. Quer uma chupada? Pra tu não cobro nada e vai ver que pode até te ajudar com a filosofia. Riram e ele respondeu – Deixa pra próxima Juju, hoje não estou digno para reexperimentar isso. Saiu rindo de sua picardia platônica (uma piada que de tão canastrona assustaria até as sombras da caverna do grego).

Foi andando em direção ao calçadão e para sua surpresa estava rolando uma pelada na areia, ali nas imediações do Acaiaca às três da manhã. Ficou sabendo por uns caras que estavam acompanho a partida que era uma partida valendo duas grades de cerveja e um litro de Johnny Walker vermelho. Os times eram formados por garçons do Ponteio e do Guaiamum e alguns deles vieram acompanhar o jogo do calçadão. Eram seis na linha e um no gol. A partida iria começar. A maré tinha recuado para também assistir o jogo, pois assim como aquela lua minguante se deitando sonolenta entre os edifícios da orla, não queria perder aquela empreitada coletiva que os homens criam para tocar a vida que de tão fatigante fazem eles se solidarizarem gratuitamente – o álcool era uma abstinente justificativa.

A partida acabou 6 a 4 para o pessoal do Guaiamum que saiu gritando e fazendo chacota com os perdedores. Aos vencedores além das batatas o gosto do dever comprido e o privilégio do lugar da piada. Aos derrotados, o gosto amargo e as críticas mútuas. Para o nosso filósofo notívago o que ficou daquilo tudo, além dos três Marlboros consumidos durante o jogo, foi que se não há experiência inédita neste mundo que não passa da representação de um outro já vivido e mais elevado, ou se somos guiados oniricamente pelos imperativos poéticos dos quatro elementos, o que aqueles homens faziam ali então? Divertindo-se? Extravasando de maneira ludopédica a exploração capitalista? O espólio do álcool no final de semana? Creio que nada disso, após esta noite a sua tese vai ganhar algo que não aparecerá em seu currículo Lattes; nos anais de congresso tampouco em sua banca de defesa. Naquela noite não foi nenhuma República, sombras na caverna ou inconsciente coletivo que fizeram aqueles homens unirem-se para jogar bola e, se a vida é tão inevitável quanto a morte, quem faz esta liga é a comunhão seja na Conselheiro Aguiar ou na areia da praia.  

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Rosário de ódio

10.12.13 Cabotino 0 Comentarios



Ao Exmo. Senhor Ex-secretário de Defesa dos Estados Unidos da América, D. H. Rumsfeld.

Venho através desta missiva manifestar o meu total repúdio à Vossa Excelência, aliás, Vossa Excelência é o caralho e repúdio é eufemismo para o que vou dizer a partir de agora.

Primeiro, eu espero que você morra lentamente e de maneira sofrível e de preferência em Abu Ghraib ou Guantánamo e que seja pelas mãos daqueles que você expropriou (via bombardeio); torturou (covardemente nos porões dos cárceres arbitrários erigidos por sua legenda, Re-pu-bli-ca-na); e matou (com o álibi da segurança nacional [leia-se Lei Contra o Terrorismo] e em prol das suas ações no pregão Down Jones onde se multiplicam os seus petrodólares).  

Toda a sua retórica afinada que fez abrir o Salão Oval para você destilar o fel de sua língua ferina aos ouvidos susceptíveis dos conservadores de Miami à Seattle não será suficiente par conter as invasões bárbaras. Elas irão, como se fosse um Far West às avessas, invadir o seu santo território – que o seu antigo chefe insistia em dizer que Deus iria protegê-lo – e irão fazer de sua bandeira, de sua declaração de independência e de todo o legado federalista, serpentinas e confetes. O carnaval será a desforra de anos de exploração e pilhagem que você e a sua atávica súcia realizaram - os outros de sua natureza que foram paridos pelas mesmas cadelas puritanas de Salt Lake City à Dallas irão também sangrar a luz dos punhais Sioux que irão lhes escalpelar.

A multidão bárbara derreterá o touro de bronze de Wall Street e lançará sobre o seu corpo e de toda a canalha do Federal Reserv até que fiquem uma pastinha cremosa que será servida nos cafés de Bagdá e o que sobrar, será embutida dentro do Túmulo do Soldado Desconhecido que ganhará pompas fúnebres carnavalescas nas ruas de Nova York no The Day of the Barbarian.

O Pentágono ganhará de presente uma comissão de embaixadores americanos que serão lobotomizados no princípio do Ingsoc para que vocês experimentem a sua própria diplomacia dita democrática.
O petróleo que vocês veneram choverá na sua residência ou no seu bunker, não adiantará se esconder, pois os bárbaros fazem o seu serviço sujo – limpam as suas ruas, lavam os seus carros, coletam os seus lixos. Eles são mais eficientes do que o Google Street View e quando você estiver todo besuntado o Cowboy da Marlboro acenderá o cigarro e jogará o fósforo sobre o seu corpo.

Por fim, caso corras para o Plenário da ONU em Nova York e comece a bradar o seu discursinho aprendido em Princeton, que é da profundeza comparada A filosofia da História de um Hegel (sic), como neste trecho:

“Estamos tentando explicar como as coisas estão, e elas estão como elas estão. Algumas coisas vão bem e outras obviamente não vão bem. Você tem dias bons e dias ruins. No caminho da democracia este é um momento, e teremos outros momentos. E serão bons momentos e momentos não tão bons.”

Para tentar proteger-se sob os auspícios desta instituição que sempre foi morosa, não é à toa que ela fica incrustada em seu território, aos interesses político/imperialista dos estadunidenses, será em vão, pois neste mesmo instante uma criança de oito anos moradora de Candaar acionará de seu smartphone o dispositivo que lançará um Tomahawk (o míssil que o Senhor diz ser inteligente) que sairá de uma das bases americanas instaladas no Oriente Médio e terá como alvo, especificamente, o meio de seus olhos. Será o milhão de dólares mais bem empregado da história.



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Vapt!

6.12.13 Unknown 0 Comentarios


Faz pouquíssimo tempo que esse negócio de internet na entrou na minha vida, menos de metade da minha existência pra cá – antes, quando muito novo, era só televisão no quengo, disputava o controle com os irmãos para deter o poder do que iríamos assistir.

Tardes densas, nas quais perdíamos o melhor da nossa infância, dividindo uma pequena TV, para ver Sessão da Tarde. Deve por isso que os amo tanto, pelo companheirismo nas piores horas – as horas da tarde, densas até demais para que eu podia suportar.

Mas falava da grande rede e é a isso que quero retornar. Estou muito acostumado com a comodidade da internet. E deslumbrado com suas possibilidades.

Ela segue, a mal dizer, a dinâmica do vapt. Estou aqui, no mundo da política brasileira e – vapt! – rapidamente me transporto para as melhores críticas de cinema do mundo virtual.

E fico lá, na manzanza, até que sem maiores explicações encho o saco e abruptamente – vapt! – me desloco para um blog sobre música brasileira, não raramente para ouvir alguma coisa de Milton Nascimento.

Enquanto isso meu irmão me pergunta se eu estou fazendo algum download, ao que respondo que não, no que ele emenda de prima dizendo que essa net é lenta pra caralho!, e que se vacilar ele vai cancelar essa porra!

Percalços de quem mora no subúrbio, onde não chegou ainda a melhor banda larga do Brasil. Nem a pior. Contentamo-nos com um pelo menos – pelo menos não fico sem acessar.

Mas a vida segue, a madrugada avança, e – vapt! – mudo de endereço outra vez e agora já estou no 
FoiHoje, lendo as crônicas dos amigos. Quando, meu Deus,-  vapt! – já estou me divertindo nos vídeos x, vídeos vermelhos, etc, da vida.

Uma pausa para o cigarro e para o café, quando volto – é vapt! – um site de futebol para checar as últimas notícias do Santa Cruz, o inigualável Santa Cruz, o mais querido do Brasil.

Entretanto, não posso deixar de ponderar algumas coisas, principalmente no que concerne às tremendas rapidez e agilidade da internet, que, às vezes,  embotece nossos sentidos e cansa demais a nossa mente. Por isso é importante uma pausa, um momento ausente ou fora do ar.

O descanso é indispensável, para evitar que as informações continuem entrando indiscriminadamente pelas narinas e que a cultura prossiga saindo em forma de mau hálito.

Contudo, o descanso é para nos prepararmos para a volta. Por que, por exemplo, eu li isso num – vapt! – site sobre comportamento, e por achar plausível, resolvi incluir nesta pobre crônica –  esta, que já não posso garantir que seja plausível.

E enquanto você lê isso, e reflete, ou não reflete, tanto faz, eu peço licença porque – vapt! – o ano de 2013 acabou, e eu já estou de posse da minha senha para festança etílica do FoiHoje:
  
- É vapt!, corta pra casa do maestro Anâsc.

E até a próxima!

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FH senha 13

6.12.13 Pássaro Bege 1 Comentarios


Peço ao Cabotino que segure só um pouco as suas flechas, que aguarde, porque até amanhã passo um fio para o maestro Anašc sobre a possibilidade de ser de novo em sua residência bucólica e etílica o encontro “FH senha 13”. Talvez, a Mm Fifi possa vir da Europa a tempo, descer ali nas mediações da Kelly e encontrar com a gente por lá. O Urubu já deve tá mais ou menos ligado, é só esperar ele voltar dos coelhos e mandar um twitter ou um sms que com certeza ele dirá: “é rocha!”. Joarez chegará rápido e, no passo daquela prosa que se espreguiça, virá de poesia, de poema - “mas que vai, vai”; “mas que vem, vem”. E a nossa Castanha? Elegante, passos comedidos pisará no salão tal qual um Fred Astaire sambando na cara da sociedade e gritando: salve! “FH senha 13”. Será bem nessa hora que João Berimbau gargalhará uma Blue Note seguida de outra gargalhada aguda do Taumaturgo de Nancy. Ambos estarão nessa hora, quem sabe, entregues aos versos de uma canção, exibindo os seus cantos e forças; paixões e fé. Felixberto com certeza discutirá comigo lá pelas tantas e, entre um cigarrinho e outro, exigirá mais autonomia e me cobrará mais trabalhos pro ano que se avizinha. Bom seria que Coraline pudesse aparecer e que o Madrazzo assumisse a missão das caipirinhas mais uma vez, naquela costura em que o sentido está além da junção entre a cachaça e o açúcar; num galimatias de gelo e limão. Carlos Daniel já foi intimado a comparecer para com sua voz firme e doce narrar o cerimonial, assim como ele aprendeu por entre os becos do Vassoural à CEU. Cobra Norato trará os ensinamentos do seu Best-seller “Se saindo das butadas” caso a polícia federal descubra essa nossa trama e queira embaçar o sistema. Não se esqueçam! “FH senha 13!” Esse texto se autodestruirá em 3, 2, 1 pros caretas; Já pros que amam o riscado espero que de alguma forma esse texto não espire, espero que fique em seus corações e mentes. No mais, assim como na festa de Cosme e Damião, aqueles que vierem sem a senha não se preocupem, jamais deixarão de ganhar as nossas guloseimas. Por fim, será realizado um bamburim de disparates, de causos e de notas, tudo isso no estilo pé no bucho e mão na cara, porque é só desse jeito que os maloqueiros sabem se divertir.    


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Etnografia de uma nota só

3.12.13 Foi Hoje! 0 Comentarios



Ouçam o som de uma acorde perfeito maior. Ouviram?

Ótimo, pois será nesse tom – pobre, apenas com uma nota – que vou lhes escrever (contar) essas letras apagadas de ciências ocultas predispostas numa linha imaginária do meu redator de texto.

Era uma tarde de sol quando resolvi finalmente passar pelo rito de passagem do trabalho de campo. Que pretensão, um jovem estudante querendo ser pesquisador. Fui ao campo. Finalmente né, depois de ter ouvido que nas minhas letras apagadas faltavam sangue e suor (sacanagem quem sabe). Coloquei minha agenda na bolsa, comprei pilhas alcalinas (no fiado de plástico) preparei o gravador, coloquei R$200 no bolso (para pagar pelas informações, pois sempre achei que nada é de graça), tomei um banho na cacimba – próximo ao rio, aquele rio dos parceiros bonitos – e fui embora para o campo.

Cheguei ao campo, mas em outro campo, pois travei e não consegui ir lá falar com quem deveria. Parei num bar, pedi uma cerveja e logo ouvi da puta triste que me atendia “Beba rapaz amanhã haverá mais aguardente” logo uma puta feliz retrucou “Buceta raspada arranha homem mal acostumado”...  Tudo isso para me servirem uma cerveja quente.

Do outro lado, um homem velho, com seus 70 anos, com voz grave, baixa estatura, caminhando lento se aproxima e diz “dê-me um cigarro seu, pois é do filtro vermelho, é mais forte que esse cigarro de algodão que eu tenho”. Dei o cigarro e comecei a conversar com o homem e ouvir suas historietas incompletas, fantasiosas, verídicas e até mesmo imaturas. Para minha surpresa, esse homem era um de meus informantes, era uma pessoa que eu estava querendo conversar, mas que infelizmente não fui ir ao local que deveria por medo, insegurança ou sei lá o que! Ele era um velho filho de santo, que conversava com um jovem filho de Comte em busca de coletar fatos/histórias/contos/mitos e afins para fazer uma pesquisa.

A partir desse dia aprendi que às vezes acertamos quando pensamos que estamos errando, que nossas letras apagadas podem se tornar fortes, que nossa ciência oculta, só é oculta, pois existem mil ocultadores e que o acorde perfeito maior era da música de Noite Ilustrada (jurei não amar ninguém, mas você veio chegando e eu fui chegando também). Aprendi também com as putas que Brahma continua sendo a melhor pedida.


Por: João Berimbau

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Pequenas coisas de que nunca me esqueci

2.12.13 Castanha 0 Comentarios



De estar chegando na casa de minha avó, nos ombros de minha mãe, e de ela ter dito “Tem um sapo aqui no caminho”; estava chovendo, eu tinha mais ou menos dois anos e nós tínhamos saído de Recife e estávamos indo morar em Gravatá. De como me sentia feliz quando minha mãe chegava do trabalho e de como me sentia triste quando ela saia; eu tinha quatro ou cinco aninhos e ela passava a semana inteira fora. De minha avó trabalhando em sua máquina de costura, na sala da pequena casa onde cresci, e dando risadas por causa dos desenhos animados que eu assistia na TV ao seu lado. De quando cheguei em casa chorando por ter sido humilhado pela professora por não saber amarrar os cadaços; neste dia me mãe me ensinou. De uma aula de guerra do Paraguai que assisti na sétima série; até hoje gosto de História... Histórias... Escuto histórias... Conto histórias... E memórias. De como fiquei eufórico quando fui ao primeiro show de rock na minha adolescência. De como odiei meu primeiro emprego; até hoje não gosto de trabalhar. De ter perdido a memória quando estava ressacado e não lembrava do que tinha acontecido na noite anterior quando me embriaguei pela primeira vez aos quinze anos; ironicamente lembro-me de quando esqueci. De como fiquei feliz quando fui aprovado para entrar na universidade. De como gostei de redescobrir “Dom Casmurro” de Machado de Assis; tinha vinte e poucos anos e poucos anos depois descobri Garcia Marquez e “Cem anos de solidão”. De como muitas vezes recebi abraços apertados de pessoas que gosto.  De como era bom dormir abraçado com uma mulher de quem muito gostei; hoje me pergunto se valeu a pena gostar tanto dela.

Castanha 02 / 12 / 2013       

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Contribuindo para as Notas

19.11.13 Unknown 0 Comentarios


Faz algum tempo que prometi ao Cabotino em colaborar, mesmo que minimamente, com suas notas de verão sobre impressões de primavera – escritos em que expõe suas observações sobre a terra de Neruda.

Não sou tão esquemático quanto o Cabotino, que vem postando suas notas em subtópicos, que vão desde o povo à política do Chile. E, deste maneira, minhas anotações serão mais aleatórias e menos sistemáticas, e por isso mesmo também menos completas.

Mas vamos lá para o meu samba de uma nota só.

Começo desfazendo qualquer ideário luso-tropical que associa uma viagem a um país frio com uma visita à neve. Não, não fui ver a neve. Menos por me achar mais sagaz que qualquer outra pessoa e mais por considerar um tremendo fumo pagar uma fortuna para ficar acasacado, morrendo de frio, aos pés dos Andes.

Não, minha curta grana eu gastei de outro modo.

Na realidade, eu sempre achei bisonhas essas viagens com companhias de turismo, que prometem te mostrar o melhor daquele lugar no menor espaço de tempo: cronômetros acertados, porque viajar é, muitos creem, guardar uma foto de cada localidade turística, e depois colocar no facebook, etc, etc.

Não que a exposição nas redes sociais seja condenável, não, jogamos o mesmo jogo, posta daí que eu curto daqui. Mas conhecer uma cidade cumprindo à risca uma lista de lugares essenciais, seguindo também meticulosamente um espaço de tempo para cada um deles, é vender um tempo precioso, aquele que deveria ser de ócio ou de lazer.

É por isso que fui andar. E numa das caminhadas pelo centro de Santiago vi a seguinte plaquinha num fiteiro: no vendo a crédito, no doy fuego, no doy información. Ethos do chileno citadino, cansado de emprestar seu isqueiro e dar informações aos brasileiros folgados que chegam falando um estranhol barulhento por lá, talvez...

Mas uma coisa é certa: por essa as companhias não esperavam!

Voltando: a primeira impressão, dizem, é que a fica. Mas eu precisei de outro exemplo para confirmar que trabalhador de rua de Santiago não gosta  muito de jogar conversa fora, o negócio é comprar, pêi-buf, e tchau. Foi numa feira de artesanato, e numa barraca não muito grande, escrito com letras também não muito grandes: si no es para comprar, por favor no tocar.

E a vendedora segurava uma revista e me fitava ao mesmo tempo, um olho no peixe e outro no gato, zelando por sua mercadoria. Comprei um marcador de livros, só para ser chato.

Chato mesmo foi o toco que eu levei num bar. Era já madrugada e eu estava alto de tantas cervejas – que dobrou de preço porque trocamos uma mesa de dentro por uma de fora do estabelecimento. Entre um gole e outro, saquei minha companheira para dançar, e... O garçom me puxa de lado e me diz que acá no se puede bailar.

Fiquei com gosto de chuchu na boca. Mas fazer o quê¿ Em terra alheia, pisa no chão devagar. Desse dia em diante deixei meus modos de recifense de lado e fui um gentleman no Chile – ou o que mais pode se aproximar disso um suburbano brasileiro.

Mas talvez eu esteja enveredando por um caminho errado, ou não previsto, por deixar mais ou menos implícito que o povo chileno é chato. Sisudo, vá lá, se assim se quer. Mas nem por isso menos acolhedor. Fui muito bem recebido por alguns colegas de lá e até nas ruas os estranhos eram pacientes comigo.

É isso: - as ruas! Acho que agora cheguei no ponto principal. Como o chileno gosta das ruas, como tem o seu senso de espaço público aguçado. A rua é um lugar que ele valoriza e ocupa. Caminha pelas avenidas, frequenta e até dorme (um banzo pós-almoço) nos parques e praças. Demais para quem cresceu sabendo que um cochilo no Parque 13 de Maio era um verdadeiro desafio.

Mas tudo isso, e toda a qualidade de vida que a cidade de Santiago tem a oferecer, custam caro. O estado neoliberal chileno é voraz. Acima me referi ao preço da cerveja que variou de acordo com espaço do bar que ocupei, mas que também varia de acordo com o horário, assim como muda de acordo com os turnos o valor da tarifa do metrô, do mesmo modo que pagar 800 pesos chilenos (cerca de 4 reais) por uma garrafa de 500ml de água é doloroso, etc, etc, etc... Pois é, a turma de Chicago botou quente por lá e o laissez-faire, que de bobo tem só o nome, não dá ponto sem nó.

E embora, no geral, a população tenha como se inserir nesse mercado, nos últimos dois anos houve significativas manifestações de rua contra os abusos dessa economia completamente desregulada, principalmente no que tange à educação pública e gratuita – ponto também muito lembrado neste ano de eleições presidências e do 25º aniversário da queda do regime militar.

Mas isso é pano para outras mangas (que o próprio Cabotino vem costurando muito bem).


Por ora, encerremos por aqui essa prosa despretensiosa, que já vai longe demais. E fiquemos, como saldo, com a cumbia de Chico Trujillo, que vai bem acompanhada de uma cerveja gelada. 

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Croniqueta

19.11.13 Cabotino 0 Comentarios



O cursor do Word pulsando regularmente como se fosse os movimentos de uma sístole e diástole pedindo que bombeie sangue, vida ou alguma coisa parecida, mas nada vem para desvirginar a tela em branco, absolutamente, nada.

Talvez seja a falta de inspiração; ou ninfas ou quem sabe o arquetípico pássaro azul. Não sei. O que sei é que já estou começando a enrolar vocês, pelo menos estamos no formato digital e nenhuma árvore foi cortada para acabar em um par de frases deste cronista bissexto e ludibriador.

Vamos lá.

Era um dia cinzento... Parou! Assim não dá, que lugar-comum. Vamos lá mais uma vez. Hoje presenciei um acontecimento... Ah! Que coisa mais cafona, quem está interessado em saber o que aconteceu comigo ou com as invenções de minha imaginação? Narrar qualquer coisa que seja em primeira pessoa ou terceira não vale os bytes da fonte verdana tamanho 12 deste texto quem dirá a sua atenção. Mas, se estiveres lendo ainda vou tentar mais uma vez dar início a alguma coisa que valha mais do que o meu silêncio ou seu precioso tempo entre o Facebook e este blogue.

Vocês querem sangue? Uma história de amor? Ou outra platitude qualquer do cotidiano de alguém? Não vou dar nada disso. Querem à minha alma ou à minha autoflagelação? Ou querem a problemática mimética de minhas experiências transplantadas para vocês que ficarão se perguntando, será que isso aconteceu com ele? Também não vou dar. Se tivesse em uma redação o chefe já estaria chupando minha carótida e berrando: cadê o texto? A Mafalda já está pronta assim como o joguinho dos sete erros e as palavras cruzadas, porém hoje, é impossível sair alguma coisa e como resposta a ele, o atiraria do alto da redação para o maquinário da gráfica só para ganhar um fato jornalístico. Mas creio que o assassinato de um chefe de redação não seja algo que valha a pena ler.

Prometo a vocês, isso aqui não vai passar de uma lauda com espaçamento simples e fonte verdana tamanho 12.

Puta que pariu, séculos e séculos de tecnologia acumulada e trabalho humano agregado e eu aqui entre os valores de troca e uso na confecção de uma cronicazinha. E viva a revolução tecnológica dos Estados Unidos da América (poderia muito bem abreviar para EUA, mas quero tomar o tempo de leitura de vocês) e o Vale do Silício e toda à mão de obra explorada nesta Meca erigida em fibra ótica que me deu as condições matérias para usurpar o seu tempo à distância nesta croniqueta. 

Narrar requer tempo e tempo é Cronos e Cronos é crônica e já que o Capital explora o trabalho pelo Mais-Valor que em síntese é o tempo acumulado e embutido na feitura de cada mercadoria, eu consegui roubar o pouco de seu tempo para a causa perdida deste texto desde o início, e, além disso, menti, já passou de uma lauda.


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Notas de verão sobre impressões de primavera [Santiago] IV

15.11.13 Foi Hoje! 0 Comentarios


POLÍTICA

O Chile pós Allende (não irei esmiuçar as implicações que levaram ao golpe militar chileno em 1973, para tanto, sugiro o documentário dirigido por P. Guzman, A batalha do Chile. Apenas vou tentar trazer alguns pontos de permanência e ausência do legado militar no país) se transformou em um verdadeiro laboratório, na América Latina, para experiências neoliberais. Não é à toa que FHC é cultuado no país e, acredito, mais como arauto do Consenso de Washington do que como o Príncipe dos Sociólogo. Há até praça inaugurada (1996) por ele próximo a Av. Brasil, no centro de Santiago, em homenagem a Tom Jobim (a Bossa Nova é a música por excelência do Brasil no Chile, algo que falei na seção sobre o Povo chileno).

Apesar dos últimos presidentes terem como plataforma ideológica o socialismo, R. Lagos e M. Bachellet (que vai tentar a reeleição em novembro), os efeitos da ditadura militar no Chile são visíveis principalmente na esfera econômica. Há um enxugamento do Estado que, para um brasileiro que conheceu pela primeira vez uma economia predominantemente neoliberal, foi algo marcante. Bens e serviços públicos estão entregues, em grande medida, às leis do mercado.

Quando fui conhecer a praia de Algarrobo, para visitar a casa de um amigo que conheci em Santiago, tentei apanhar o ônibus intermunicipal no terminal rodoviário da Estação Universidade do Chile. No terminal, tive vontade de ir ao banheiro e, para a minha surpresa, tive que pagar 250 pesos, algo em torno de um real e pouco para ter acesso ao serviço. Não bastasse o bilhete de metrô (Bip) que custa 610 pesos no horário do rush que tive que pegar para chegar ao terminal. Pois é, o preço dos bens e serviços em Santiago variam de acordo com o horário. Não estranhe pagar 1300 pesos em uma cerveja e após as 21h o preço da mesma subir para 1500 pesos, essa prática é moeda corrente por lá.

O Chile atual está menos nerudiano e mais bolañiano.

Conversando com uma professora (fã de Fagner) de surf, nas águas gélidas do pacífico, que conheci em Santiago por ocasião de uma festa no 19º andar de um apartamento à noite onde se via toda a Santiago em seu esplendor de mercúrio. Ela me falou que se você não estudar em uma escola boa (leia-se privada) na infância, você não tem chance de cursar uma universidade boa (leia-se novamente, privada). Fiquei alarmado, mas o baque maior veio logo em seguida, disse-me também que comida em Santiago é artigo de luxo. Depois ela me localizou, da sacada do apartamento, a disposição espacial/econômica da cidade de Santiago, o leste é onde concentra-se os ricos da cidade, a classe média fica ao norte e oeste (mais acentuadamente) e a classe baixa ao sul. Foi uma boa aula de surf.

Um dado interessante é que cheguei à Santiago por ocasião do 40º aniversário do golpe militar de 11 de setembro de 1973 (curioso que para Washington o único 11 de setembro que existe é de 2001, e o de destituir um presidente democraticamente eleito não conta, é ideologia). E também estava comemorando-se as festividades da Fiestas Pátrias (ou o Dezoito) algo parecido como a semana da Pátria, comemorado especificamente, nos dias 18 e 19 de setembro.

Ao chegar ao país, estranhei a enorme concentração de bandeiras chilenas no caminho do aeroporto, desde favelas até a Vicuña Mackena, rua onde fiquei instalado em um hostel no centro de Santiago. Daí perguntei-me, de onde vem este patriotismo? Talvez venha de uma estratégia, escolhida pelo povo chileno, de esquecer o que tivera acontecido há quarenta anos. Cada povo escolhe sua maneira de esquecer ou purgar seus males políticos, o nosso ainda está indelével por conta dos arquivos que não foram completamente abertos e que talvez tenha sido detonado (a soma dos “resíduos” na acepção de H. Lefébvre) nas jornadas de junho deste ano. No caso chileno, houve a tentativa de julgamento de A. Pinochet (em 2005, não efetivado devido à morte do facínora um ano depois) e as ruas que foram tomadas recentemente, em grande medida, em prol da gratuidade da educação superior.

Andando pela zona oeste da capital chilena percebemos como a cidade passou por um processo de Manhattização, principalmente no empreendimento imobiliário/financeiro conhecido como: Costanera Center. Uma construção faraónica incrustada na Comuna de Providence e que é um complexo comercial que congrega o maior edifício da América Latina, próximo à estação do metrô de Tobalaba. Um dado curioso é que, cada bairro de Santiago, conhecido como Comuna, é autônomo em relação ao poder municipal, ou seja, os bairros mais ricos coletam mais impostos que são convertidos em bens e serviços no próprio bairro. Essa prática administrativa descentralizada reproduz a própria estrutura financeira da cidade, quem possui mais condições continua assim, que possui menos...

Suscitei em uma das seções anteriores a biopolítica que perpassa a austeridade andina. Esse fato fica claro quando andamos pelo bairro boêmio da Bela Vista, ele é uma sinédoque do que há em toda Santiago, não se pode beber na rua, salvo se o bar tiver cadeiras e mesas nas calçadas, excetuando isso, não. O que me assustou mais foi à relação estabelecida pelos carabineiros (policiais) com outros povos andinos, principalmente os bolivianos e peruanos, eles são truculentos e pouco tolerantes em relação a estas duas populações. Um exemplo, se eles virem um deles (detectados pelo biótipo andino) bebendo na rua, provavelmente, o enquadrará. Se for brasileiro, eles relativizam, dão uma advertência. Talvez este tratamento diferenciado conosco não seja oriundo de uma deferência com o jeito entretenido (bonachão) de nós brasileiros, mas sim a amplitude política que nós adquirimos no cenário internacional nos últimos anos. Quando a desigualdade é manifesta na enunciação, é fundamental ter um bom serviço diplomático lhe respaldando, os ingleses praticam isso há séculos.

Ainda em relação ao tema da biopolítica e também ainda sobre o álcool, percebi um dia em que caminhava pela Praça Brasil em busca de algum restaurante que vendesse comida brasileira, pois o imperativo do hábito não reconhece nacionalidades, me deparei no horário com vários estudantes, crianças, casais etc. espalhados pela praça. As mulheres chilenas são muito bonitas e as colegiais lembram personagens dos HQs Hentais – saia de prega, meia arrastão, penteados sóbrios. Acredito que a austeridade andina recaiam mais sobre elas (como de costume) do que nos meninos. Vi alguns garotos no referido logradouro, sacando umas cervejas da mochila e fumando – Santiago é uma cidade de muitos tabagistas. As colegiais também fumavam e com uma destreza típica de anos de tabagismo. Comecei a perceber que há várias brechas dentro da política “oficial” da austeridade inseridas no cotidiano do chileno, ele, assim como nós, aprendeu as estratégias para uma vida mais leve em meio à atmosfera neoliberal que paira sobre todos, onde as regras do mercado que solapam, em grande parte, as do Estado são muitas vezes mais fóbicas do que as do Leviatã.

As ingerências do mercado só não são mais sufocantes para o chileno porque ele é um povo que ama a rua e não será nenhum Consenso de Washington que roubará isso deles.

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por Renato K. Silva - Pós-graduando em Ciências Sociais pela UFRN    
           
           


            

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Notas de verão sobre impressões de primavera [Santiago] III

15.11.13 Foi Hoje! 0 Comentarios



Gastronomia

A Ignácio por nos ensinar um outro tipo de cordialidade.

Beber e comer no Chile são duas experiências ímpares para nós habituados a boa mesa, refiro-me primeiramente a opulência da gastronomia brasileira no sentido das diversidades de especiarias, leguminosas, grãos etc. não tanto na acepção da qualidade do sabor da cozinha chilena, se bem que esta deixou a desejar para alguns de nós. Há de se ressaltar as limitações geográficas do Chile no que tange as diversidades alimentícias que encontramos em nosso país. De qualquer forma, como falei na seção anterior, comer e beber bem no Chile são artigos que requer dispêndio, coisa rara para um visitante incauto.

Para todos os efeitos, a impressão sobre a cozinha chilena (vou me ater mais a de Santiago) é a de algo célere, a vida em Santiago é acelerada e por isso há na cidade inúmeras redes de fast foods, barraquinhas de comidas rápidas a base de muita fritura espalhadas nas ruas (destaque para a sopaipilla), além do onipresente pollo con papas fritas – ¼ de frango acompanhado com batata frita.

Vou começar pelo pollo con papas fritas, comi-os em várias partes da cidade e percebi em todos que eles são servidos austeramente (exceção feita ao que comi no Cerro San Cristóbal), ou seja, não há os típicos condimentos que encontramos em nosso frango quando preparado. O pollo chileno é sóbrio, desprovido de especiarias, exceto pelo sal. A batata frita é banhada no óleo, é grudenta e tem um aspecto graxoso. Talvez seja uma estratégia não deliberada para suportar o frio, quanto mais colesterol no organismo, mais nos aquecemos dele. Apesar disso, o chileno no geral não é gordo, eles mantem a magreza, acredito, a partir do regramento alimentício e também pelo desequilíbrio na balança calórica, por exemplo: Santiago é uma cidade que consome muito sorvete, mesmo no frio, mas o sundae deles é menos doce do que o nosso, percebi isso até no sorvete do McDonald’s.

Antes de falar sobre outras características da mesa chilena, vou falar sobre a água. Primeiramente, o chileno é acostumado a tomar água da torneira algo que para nós nordestinos após o surto do cólera no início dos 1990 ficou inviável, para quem tem condições, tomar água sem ser envasada. No caso chileno, a água envasada (que chamamos também de mineral) é muito cara, lembro que comprei uma garrafinha de 600 ml no Cerro Santa Luzia por 800 pesos, ou seja, algo em torno de R$ 4. Além disso, a água mineral tem um sabor muito forte, inclusive a vendida pela Coca-Cola.

Em relação à sobriedade da cozinha chilena, destaque para o hot-dog que é muito parecido com os que vemos nos filmes americanos e também nos comercias de ketchup. Um impávido pão sedinha com uma anêmica salsichinha dentro à base de ketchup, mostarda e maionese a gosto do cliente que capricha nestes condimentos, caso contrário, fica difícil engoli-lo. Porém, o hambúrguer é gigantesco, recheado de carne e legumes muito apreciado em todos os lugares.

É lugar-comum falar do vinho chileno, é bom e barato. Mas, a bebida alcoólica que vi mais ser consumida foi o pisco com Coca-Cola que diferente do vinho, congrega mais as pessoas, primeiro por ser mais barata e depois por ter um teor etílico mais elevado. Porém, a bebida que mais apreciei foi o Terromoto (feito basicamente de pipeño, vinho branco, creme de abacaxi, ananás, e estocadas de Fernet, grenadine e bitters) consumida em La Piojera – El palacio popular. Sobre este espaço, falou-me uma amiga que conheci em Santiago que ele era um ponto de apoio para os comerciantes que vinham do interior negociar na capital. Lá eles comiam, bebiam e dormiam. Sem dúvida, La Piojera é a topografia que berra contra os acordes afinados do capital neoliberal chileno. O lugar é sujo, cheios de bêbados, gente de toda a cor (encontrei mais negros neste lugar do que em toda Santiago enquanto estive nela). O Terromoto de La Pijera é literal, dois deles (cada um tem 500ml) lhe derruba. Além disso, há música típica em todo lugar e pessoas dançando, cantando e se equilibrando entre as pernas por conta do Terremoto. Lembro-me que saí de lá acompanhado de um casal de amigos, todos nós rindo e cantando rumo à estação Puente Cal y Canto.

Em Santiago os nossos “irmãos siameses”, arroz e feijão, foram separados. É difícil encontrar feijão na cidade, eu em particular, não consegui encontrá-lo. Além disso, as refeições prontas (o nosso PF) vendidas em Santiago vêm envelopadas em papel contato e em uma bandejinha, minúscula, de plástico pronto para ir ao microondas. Arroz branco com ervilha e milho verde (lembra um Cup Noodles), uns legumes e a carne bovina, frango ou porco. A carne suína (cerdo) é bastante apreciada no Chile e ela é servida, em sua maioria, na forma guisada.

Uma coisa que chamou a minha atenção nos restaurantes que frequentei no país é a entrada dos pratos, eles sempre são servidos, em toda a parte, por um pebre (tipo uma vinagrete com pimenta, tomate, cebola, salsinha) acompanhado de uns pãezinhos com um pouco de manteiga separada, uma entrada elegante, singela e saborosíssima que encantou este conviva acostumado a não ter cerimonia inicial ao comer.

O único dia em que comi à tripa solta (regaladamente) sem ser na casa de Ignácio em minha última noite em Santiago, foi em Valparaíso quando tive a felicidade de pedir um prato de marisco em um animado restaurante próximo a Plaza Sotomayor. O prato foi suntuoso, extremamente forte e opulento. Lembro-me que suava a cântaros, tomei umas cervejas para acompanhá-lo e ao som de música local, foi uma refeição inesquecível. Alguns dos convivas (amigos e demais) que estavam comigo no restaurante pediram um filé de merluza e qual não foi minha surpresa quando o prato chegou, uma merluza inteira acompanhada de batata frita (foram as mais secas que vi no Chile assim como a merluza). Talvez Valparaíso por ser uma cidade portuária e deter uma enorme quantidade de mão de obra braçal, além de ser uma cidade historicamente de lutas políticas que infelizmente viu a conspiração nascer em seu seio em 1973, possua uma mesa que transborda, que rompe brevemente aquilo que caracterizei de austeridade e que ultrapassa os limites da subjetividade para adentrar na prosa da vida chilena.

As duas cervejas mais consumidas por mim em Santiago foram a Cristal e a Escudo, ambas em formato de um litro. Bebi-as em grande parte no bairro da Bela Vista e no de Providence e também em Viña del Mar. Algo a ser destacado no consumo da cerveja na cidade é que ela é servida quase a temperatura ambiente, estranhei de início, mas as temperaturas à noite chegando a 2° Celsius... Outra coisa é que as cervejas não precisam de abridor, as tampas são rosqueadas. Beber ao ar livre, prática comum a um boêmio dos trópicos, é algo difícil na primavera chilena, o frio inviabiliza qualquer estadia na calçada para apreciar a paisagem das muy guapas chicas chilenas e das belas calles da cidade. Há quem tenha condições de pagar por uma mesa com calefação, quem não tem precisa do Outro para se aquecer no interior de alguma taverna, os “lisos” no frio se solidarizam. 
           
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por Renato K. Silva - Pós-graduando em Ciências Sociais pela UFRN
            

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