Causos 16: Dicas para o ofício de ladrão

24.10.10 Foi Hoje! 3 Comentarios


Tenho um amigo que gosta de dizer “confusão só presta grande”, concordo. Pra qualquer coisa que a gente vai fazer a gente tem que fazer bem feito, mesmo que seja uma “confusão”.

Nunca exerci o ofício de ladrão, mas coloco nas próximas linhas três pontos que acredito que devam ser levados em conta pelos profissionais da área na elaboração de uma atividade.

Semana passada, no pequeno município de Chã Grande, dois homens assaltaram uma farmácia. Foi um assalto embaraçoso.

Primeiro: Se você decide assaltar um lugar, tem que ser um lugar que dê dinheiro de verdade; duvido muito que uma pequena farmácia de uma pequena cidade dê grandes lucros.

Segundo: Você tem que conhecer os arredores do lugar para não tropeçar nas próprias pernas na hora da fuga; fugindo da polícia os ladrões foram parar numa rua que não conheciam e caíram numa ribanceira perto de um terreno baldio. Ficaram por ali mesmo.

Terceiro: Você precisa de um parceiro que tenha o mínimo de ética profissional; depois de tanta trapalhada um dos dois ladrões saiu do carro gritando pra polícia “eu sou o refém, eu sou o refém”, tenha dó, santa covardia! Indignado o outro ladrão gritou “cala boca cabra-safado, tu tava roubando comigo”.

Castanha 24 / 10 / 2010

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ROBERTO DEIXA ESSA

24.10.10 Foi Hoje! 4 Comentarios


Dedicado a Sr. Zé


Vindo da universidade com dez conto no bolso, parei no boteco de Luiz Henrique: Quero plantas bar, nome esse em virtude dele vender plantas, jarros, adubos e que aos poucos foram sendo substituídos por garrafas de cana, carnes e sardinhas em latas, cerveja e etc... Eu sempre costumo dizer a ele que o nome do bar deveria ser mudado para: bar-bicha, pelo fato dele usar cavanhaque ou bar da erva.

Ao chegar ao balcão improvisado com umas madeiras sobrepostas com um tecido preto forrado sob jarros remanescentes, garrafas de caldinho, cinzeiros e mini-copos de água ardente, reparei que Pholhas estava tocando no som, e que tinha um coroa conversando com ele do lado de dentro do balcão, estranhei esse fato, paguei os três conto que tava devendo a ele de um fiado, uma cerveja e meia no prego. Vi que o coroa continuava em sua posição totêmica, o seu rosto tinha uma placidez invejável como a que Robert De Niro tem no final do filme – Taxi driver – a cabeleira prateada como uma lua que já pôs o sol pra dormir várias vezes, os braços cruzados sobre a barriga, um homem sem barriga é um homem sem história.

Comecei a conversa de sempre que tenho quando encontro com Henrique, principalmente, quando vou lhe pagar os meus penduras, ele me chama de burguês e eu o chamo de canalha, um papo mimético. E o coroa rindo da nossa conversa, aquela risada despretensiosa, como aquelas que temos quando damos uma buchuda no dominó ou arrastamos alguma grana no bicho. De repente eu comecei a falar dos Pholhas, e o coroa me respondeu que tem tudo deles em sua casa e Luiz dizendo que comprou o CD por dois reais no Centro, a música na era da reprodutibilidade afetiva e barata. Daí o coroa das madeixas de níquel, me falou que ouvia os caras desde sua época de circo. Será que a vida de todo homem tem uma época de circo, como os elefantes adestrados pacíficos e medíocres que apesar disso tem a tromba e seus dias de furor?

Bem, perguntei a ele o que fazia no circo e logo após perguntei-lhe o seu nome, pois é... A curiosidade antecede o formalismo. Ele foi primeiramente formal, se a curiosidade não mata o gato, o tempo tão pouco. Disse-me que se chamava: José Francisco de Oliveira, mas, que todo mundo lhe chamava de Zé, mais um José, só que esse não queria voltar para Minas, mas sim para as lonas, falou que a televisão acabou com o circo e que no passado trabalhar no picadeiro dava até pra tirar um trocado. Indaguei o que ele fazia no circo; ele me disse que fazia de tudo um pouco, já foi palhaço, tirou coelhos da cartola e que continua tirando até hoje e saltou uma risada, mas tinha duas coisas certas que fazia sobre as lonas, uma era o globo da morte e a outra era o cover de Roberto Carlos, daí me caiu os bônus sobre a permanência da cabeleira basta e bem cuidada.

Perguntei quantas motos tinha o globo da morte que ele fazia, disse que eram duas, e que abandonou essa atividade em virtude de um acidente e levantou a calça jeans e me mostrou a enorme cicatriz, creio que essas são as verdadeiras tatuagens da vida, as carpas da sobrevivência. Depois do acidente abandonou de uma vez o globo da morte, mas que continua fazendo cover do Rei até hoje, nesses circos de pequeno porte, diz que em dias de apresentação ainda fica nervoso, borrifa um tom mais escuro através de uma tinta spray temporária nos cabelos, o terno branco somado com a sua herança do acidente que veio junto com a cicatriz, desde então ele puxa a perna direita quando anda.

Por: R. Ribalta

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Duas crônicas e um poema

12.10.10 Foi Hoje! 4 Comentarios


Fui à delegacia registrar a ocorrência do sumiço de duas crônicas e um poema que acabara de escrever. Chegando ao recinto percebi uma movimentação diferente. Fiquei de cara com a figura que estava sendo autuada!... O “pica-pau” foi enquadrado com anfetaminas e no interrogatório entregou os outros personagens:

- Então?...Está explicada aquela risada elétrica, metendo o rosto nas arvores, postes, perturbando a ordem dos desenhos, concluiu o delegado.

O pássaro rebateu as insinuações dizendo que ultimamente estava no stress, que tomara doses cada vez maiores, mas tudo comprado com receita médica e que outros personagens usavam certos tipos de aliviadores do dia a dia e nem assim perturbavam a ordem das Es(his)torinhas.
Salsicha e Scooby, por exemplo, por que aquela fome insaciável? Os dois sempre saindo em meio aos episódios, aquelas risadas intermináveis, dizem que os cachorros são espelhos de seus donos.
Sem falar o marinheiro Popay naquelas situações de perigo! Brutos trapaceando, tentando seduzir Olivia a todo custo... Popay!Cadê você, popay... E quando tudo parece perdido? Popay come aquela planta enlatada... Fica forte, potente, voa, salvas personagens em dificuldades... Não estou insinuando nada! Mas e os smarffs?...

- Olhe aqui pica-pau... Se você pretende caluniar para aliviar sua barra, vou logo avisando que essa não cola...

- Não estou caluniando ninguém.

Deixe terminar meu depoimento e só depois tire suas conclusões. O fato é que gargameu e o gato cruel tentam de todas as maneiras de rangar os indefesos duendes. Quando as coisas apertam os pequeninos comem certas espécies de cogumelos e ganham habilidade extraordinária, pulam, correm, levantam, e a dupla do mau não consegue seu intento. Não posso me esquecer dos ursinhos Gummy vivendo na floresta, conhecedores das plantas, preparam um chá avermelhado que os traz vitalidade, resistência e coragem contra seus inimigos... rê...rê...rê...

- Isso não anula seu flagrante e sua transgressão, pica-pau!... O delegado foi taxativo:

- Sua pena é exibir seus episódios em canais abertos, vai ter que participar de terapias de grupo com o seu roteirista, ajudar personagens com dificuldades de canais e lutar politicamente pela exibição de desenhos das antigas, para que as novas geraçãoes tenham mais contatos com desenhos criativos.

A autoridade dispensou o pássaro e perguntou o meu problema. Disse-lhe que desapareceram duas crônicas e um poema que escrevera ontem de madrugada:

- Onde o senhor estava, quando viu os escritos pela ultima vez?—Pergunta ele.

- No mini-bar nossa senhora aparecida. O delegado tomou um gole de café, coçou a cabeça com impaciência e disse:

- De madrugada, num mini-bar, escrevendo?...Você já procurou essas estórias na mesa onde estavas ontem à noite????

Por Amâncio Norato

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Causos 15: Um dia da caça, outro do caçador

3.10.10 Foi Hoje! 2 Comentarios


“Atire a primeira pedra quem nunca cometeu pecados”, com estas palavras Jesus acalmou um momento de muvuca, estabeleceu um sábio ditado e salvou Madalena, mulher experiente na profissão mais antiga do mundo.
Aqui na rua tem um salão de beleza, um desses pequenos salões de periferia. Até um tempo atrás esse salão pertencia a um sujeito que eu conheço por “irmão”. Esse sujeito cortou meu cabelo tantas e tantas vezes, mas eu nunca soube o nome dele. Sou muito ruim de vizinhança, e por isso mesmo não sei nem o nome do “irmão” nem o de quase ninguém aqui no bairro. Mas sei que o “irmão” era chamado assim por ser muito religioso. Cortando o cabelo com o “irmão” eu me atualizava; sentado na cadeira eu o escutava me dizer quem tinha traído o marido ou a esposa, com quem tinha traído, onde tinha traído, porque tinha traído e daí em diante. Sabia quantas meninas do bairro tinham perdido a virgindade no ultimo mês, com quem tinham perdido, se tinha sido bom ou ruim etc. Sabia quem era cachaceiro, quem era mentiroso, quem era canalha, quem não gostava de tomar banho e tantos outros pormenores sobre a vizinhança, que a gente só fica sabendo quando deixa um bom “irmão” fofoqueiro cortar nosso cabelo. O sujeito era uma máquina na arte de observar a vida alheia. Mas nada é pra sempre e tudo tem sua volta. No salão do “irmão” trabalhava uma moça muito calada e gentil que não era feia, apesar de não ser bonita. Um dia a esposa do “irmão” chegou sem avisar e encontrou seu marido no banheiro agarrado com a tal moça. Não sei qual era a posição do coito no momento do flagra, amigo leitor, mas deve ter sido algo muito constrangedor para os três envolvidos, pois no dia seguinte estava desfeita a união matrimonial, a assistente tinha sumido das redondezas e o salão do “irmão” estava fechado e só abriria novamente tempos depois sob nova administração. Ouvi dizer ainda que a esposa traída praguejou horrores contra o recente ex marido. Quanto ao “irmão”, bem, da ultima vez que tive notícias, ele tinha mudado de profissão e estava trabalhando bem longe daqui.
Pois é, Jesus é que estava certo!

Castanha 02 / 10 / 2010

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Recomendo

2.10.10 Foi Hoje! 2 Comentarios


A cigana, misto de curandeira e de profeta, na encruzilhada dos traídos com os ressacados de amor, sentada bem no meio da rua. Tronco ereto, olhar imponente e palavras concisas:
- Recomendo só o que é bom, aquilo dá efeito.

O transeunte pára, a olha meio de soslaio, e pergunta inseguramente:
- Pra ferida não curada?
- Chá morno de aroeira e delicadas lambidas caninas, pra fazer casca mais rápido. - responde a cigana.
- Não, pra ferida assim não, dor assim não. Pra dor de gente mesmo, que dói sem fazer buraco. - explica o atabalhoado andante.
- Deve ser gases, então recomendo chá de boldo, meia fruta-pão e batidas com a palma das mãos nos locais específicos da dor. É tiro e queda. - diz a cigana sem perder a pose.
- Não, moça! É dor de gente que perdeu gente. - impacienta-se o andarilho.
- Se for perda de mãe, recomendo ar puro, cigarro de palha, pata esquerda de porco recém-nascido pra pendurar no pescoço e meditações noturnas pra aliviar a angústia. Se for de irmã, gota de veneno de cobra-buchuda-do-mato-de-dentro. Se for de pai, suco de melancia com erva pontuda de pigmento vermelho. E se for de amigo, outro amigo.
- Vixe, ainda não acertasse. - desanima-se o ouvinte.
- Se for dor de quem perdeu a mulher...
- Sim, sim... – anima-se o rapaz.
- Dor de corno... - continua a cigana.
- É, é... – confirma o cabra vacilante e envergonhado.
- Recomendo uma garrafa de cachaça e 'Torturas de Amor' do mestre Waldick, para servir de trilha e, acima de tudo, pra ajudar a se conformar. Porque em caso assim, só resta aceitar e ponto! Porque, como se diz na terra dessa humilde cigana, que ora vos bafeja ao cangote, chifre foi feito pra homem, boi usa de atrevido que é.

Depois de ouvir isso, o andarilho distraído, mais sensível do que pele queimada, e que passara ali por um mero acaso, deságua numa choradeira barulhenta e profunda.
E a cigana replica firme:
- Eu digo e tenho dito: recomendo só o que é bom, aquilo dá efeito.


Escrito por Rosano Freire
Postado por Pagú.

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