Terceiro Monólogo: (é tudo invenção, nada é real!)
Cassiana:
Trinta
e sete anos. Solteira. Entediada com a vida. Não quer ser mãe. Tem temperamento
forte. Não gosta de ter gostado de Luco.
Cassiana estava no ônibus, sentada, pensado
que aquilo era coisa rara, estar no coletivo que não estava lotado apesar de
ser quase horário de pico. Viu um cachorro morto no canto da avenida,
provavelmente atropelado; lembrou de ter visto uma matéria na TV onde um
cientista propunha usar sangue de animais na produção de cola e pensou “A gente
faz com os animais o que não suportamos que façam com a gente... E tem muita
gente que faz com as pessoas o que não se devia fazer nem com os bichos”. Por
uns instantes pensou em nada e foi interrompida por ver entrando no ônibus uma
moça alta, morena, nem bonita nem feia, com o rosto desenhado por uns traços
grossos que eram sim esquisitos, mas também interessantes. Cassiana gelou “Puta
que pariu! É a mulher de Luco, aquele cachorro” disse para si. A ironia foi
maior quando a moça caminhou e sentou, com tantas cadeiras disponíveis, ao lado
de Cassiana. “Caralho! Será que ela sabe?”, mas em seguida relaxou percebendo
que a moça se comportava com uma frieza que só o desconhecimento total dos fatos
pode gerar. “Nunca mais quero conversa com ele! Homem casado é uma merda! Deixa
ele lá! No bar dele, vendendo cerveja choca pra os papudinhos da Várzea”. Olhou
pelo canto do olho para a moça e recuou. “É muito esquisito estar do lado
dela... Se ela soubesse... Marido cachorro... Coitada”. Lembrou das ultimas
vezes que beijou e se deitou com Luco e um calafrio que era uma mistura de asco
com arrependimento correu seu interior. “Quando a gente não quer ficar só a gente
se joga nas situações... A solidão é uma bosta... A gente anda meio mundo, vê coisas,
vive coisas, mas no final, bom mesmo é ter alguém pra fazer cafuné na gente. A
gente precisa de alguém pra amar pra ver se assim a pessoa ama a gente
também... No final, nessa lógica, amar o outro é um jeito de amar a gente
mesmo”. Olhou para a rua, avistou um grupo de estudantes saindo de uma escola
de ensino médio; reiniciou o monólogo “Não serei mãe, quem quiser que fique com
essa história de que a mulher precisa ser mãe pra ser completa... Eu já nasci
completa. Criança pra me dar trabalho?! Pra chupar meus peitos até ficarem murchos?!
Pra me deixar gorda e flácida depois que nasce?! Pra me prender pro resto da
vida com todo tipo de responsabilidade?! Pra eu descobrir na prática o que é
estar presa a um ser que quanto mais se afasta da gente, pela distância e pelo
tempo, mais a gente se sente presa a ele?! Eu não! Nunca!”. A simples ideia de
assumir essa responsabilidade irritou Cassiana e em seguida lembrou-se de Luco
e também da esposa de Luco, ali ao lado, e ficou ainda mais irritada e então
percebeu que sua parada era a próxima, então levantou e pediu licença para
passar e foi com um olhar esnobe que a esposa de Luco lhe concedeu passagem e
então ela disse pra si mesma “Cachorra esnobe, merece aquele traste!”.
Castanha
10/05/2014
Para entender melhor esse Monólogo, leia o anterior http://foihoje.blogspot.com.br/2014/05/segundo-monologo-e-tudo-invencao-nada-e.html
Para entender melhor esse Monólogo, leia o anterior http://foihoje.blogspot.com.br/2014/05/segundo-monologo-e-tudo-invencao-nada-e.html
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