Sindicato dos Remadores
Atônita,
a velhinha colocava os óculos no rosto para ver a multidão que se aproximava.
Estava impressionada: apesar de morar ao lado do rio não imaginava que nessa
cidade existissem tantos remadores, menos ainda que a classe fosse organizada
em forma de sindicato. De longe, lá vinham eles, empunhando bandeiras e
cartazes, entoando algumas rimas, bradavam forte e determinados. Com algum esforço conseguia-se
perceber: o que eles reivindicavam era um rio limpo. Não aceitavam ter que
trabalhar se acotovelando com garrafas pet, sofás e TV’s, e cheirando a bosta e
o mijo dos moradores dos prédios mais luxuosos da cidade. Estavam decididos,
queriam fazer um projeto de lei, não aceitavam só palavra e tapinha nas costas.
Auxiliados por um jurista que apoiava a causa, pensaram até num nome para a
nova regra que queriam promulgada, com o latinzinho adornativo de costume e
tudo, algo como jogae detrictus no lixum.
Daí a pouco, a polícia militar, a mando do prefeito, chega para conter a
manifestação que as rádios locais até então noticiavam que era pacífica e
ordeira. Foi uma contenção regada a
cassetetes, balas de borracha, bom de gás e de efeito moral, socos e pontapés,
respeitem a autoridade! – e salve-se quem puder. Quando poeira baixou, e o gás
das bombas se dispersou, a velhinha, que ainda tentava digerir a pauta dos
remadores, se levantou, foi até a beirada da ponte, arremessou o embrulho da
jujuba e resmungou: - Mas é cada uma que me aparece!
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