As rasteiras de Petra Laszlo
Petra
Laszlo é o nome da cinegrafista húngara que passou a perna, literalmente, por
meio de rasteiras e chutes, nos exilados políticos sírios que estavam fugindo
da polícia húngara que os acossavam por buscarem melhores condições de vida no
continente europeu, em especial, na zona mais favorecida da região do Euro, os
países ao norte do continente.
Chamei
acima de exilados políticos ao invés de refugiados por acreditar que a palavra
refugiado guarda forte conotação de refugo, ou seja, lixo.
Segundo
entrevistas da própria P. Laszlo, o que a levou a dar rasteiras nos exilados
políticos, foi uma postura não deliberada por conta do rompimento intempestivo
do cerco que a polícia havia feito. Isto é, segundo suas afirmações, ela teria
entrado em pânico e agido de maneira inconsciente.
Pois
bem, acredito que seja secundário tentar encontrar a “gênese” das ações de P.
Laszlo, se fora consciente ou não. O que sei é que aquelas rasteiras não eram
apenas disferidas por P. Laszlo, foram as rasteiras de um continente assustado
com a quantidade de refugiados, lixo, entrando massivamente em seus domínios.
P.
Laszlo é a sinédoque (a parte pelo todo) de um continente que, de maneira estranha,
se estarrece com o fenômeno dos refugiados políticos. Explico-me, se reparamos
bem nas imagens, veremos que ela é uma mulher branca, magra, até então com
emprego fixo, uma câmera na mão e uma máscara no rosto.
A câmera
e a máscara são dois objetos que refletem sobremaneira a relação que o Ocidente
estabelece com aquilo que lhe é estranho. No primeiro momento, a vontade de registro
e divulgação, por meio de inúmeras mídias para os lares do welfare state ocidental, a posteriori, comoção e indignação, como
fora o caso, por exemplo, do refugiado sírio, Aylan Kurdi, encontrado morto em
uma praia grega dias antes. A câmera fizera o registro do sonho por uma vida
melhor sendo soçobrado em uma praia do mar grego, berço da civilização
ocidental.
O que
mais incomodou o mundo ocidental é que o garoto Aylan Kurdi era branco, estava
bem vestido e calçado. A imagem foi inadmissível para uma região do planeta (Ocidente)
que acredita sobretudo num credo (Cristianismo) onde seu Messias veio ao mundo como uma
criança, Jesus Cristo.
Já a
máscara no rosto de P. Laszlo é o contraponto à câmera, se esta precisa cumprir
sua função de registro, a máscara diz para o objeto retratado pela câmera, que
ele não é um igual a quem faz o registro, ele é lixo e como tal é preciso
evitar o contato físico e a contaminação pelo ar.
Neste
sentido, a câmera e a máscara são os instrumentos que a Europa escolheu para se
relacionar com os refugiados: registrar a dor do outro, mas evitando o contato,
inclusive o compartilhamento do mesmo ar. E as rasteiras foram para lembrar em
que lugar deve ficar o lixo: ao rés-do-chão do capitalismo de bem-estar social.
por Renato K. Silva, doutorando em Ciências Sociais pela UFRN.
por Renato K. Silva, doutorando em Ciências Sociais pela UFRN.
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Fonte das fotografias: Google Imagens.
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