Atmas e Mahatmas
Tenho uma cadelinha chamada: Atma (alma),
companheira de toda hora, faça chuva ou sol a sua cauda sempre balança quando
chego em casa, sinal de alegria, cumplicidade, carinho. Semana passada, resolvi
aumentar o número da família, encontrei um gatinho na rua e trouxe-o aqui para
casa e batizei-o de Mahatma – Grande Alma. Agora além de Atma tenho em casa o
Mahatma, o Grande Alma “Sebosa”, isso sim é o que ele é - indiferente a tudo,
exceto ao seu estômago. Quando está com fome vem logo em meu encalço, miando e
roçando a sua pelugem preta em minha perna.
Comecei a delinear algumas comparações entre os
homens e estas duas criaturas quadrúpedes que moram comigo, existem os homens
Atmas, os cachorros. E os homens Mahatmas, os gatos.
Os Atmas são obedientes, atenciosos,
carinhosos, só comem quando damos, nunca pedem, e sempre no mesmo prato, jamais
se arriscam em empreitadas externas, só comem em casa.
Já os Mahatmas são misteriosos, chegam na
calada da noite, não fazem barulho, enroscam-se na gente, pede comida, abrigo e
depois sem agradecer vão embora assim como vieram, na surdina, em silêncio e em
busca de outras refeições.
Os Atmas são casa própria, segurança,
estabilidade, emprego público, latido para os forasteiros, ciumentos, coleira,
controle, planejamento, pau pra toda obra – Tom Hanks de riso fácil, olhar
terno e acolhedor.
Já os Mahatmas são aluguel, insegurança,
instabilidade, independentes e indiferente aos forasteiros, fujões, senhores do
próprio nariz, mas sensíveis, amantes felinos – Johnny Depp de riso faceiro e
olhar superior.
Os Mahatmas são bons meninos, nota dez, Q.I de
158, esforçados, sujam tudo, às vezes arredios, mas se assustam com fogos de
artifício e com os trovões, sem saberem que estes se vão junto com a tempestade
– Raskolnikov apavorado em sua triste e fria São Petersburgo, seres
extraordinários.
Já os Atmas são meninos levados, arruaceiros, avessos
à disciplina e a diligência, porém asseados, higiênicos, nunca deixam vestígios,
limpam tudo. São irredutíveis a caprichos alheios, a gritos e admoestações
intempestivas de superioridade – Julien Sorel em busca de um Brumário qualquer,
seres ordinários.
Estou aprendendo a conviver com estas duas criaturas
aqui em casa, é um pega pra capar danado quando ambas se encontram, mas eu intervenho
e tudo fica em paz, alimento as duas, só assim mantenho-as por perto. Sou o sol
das duas, uma é a terra, a outra a lua e ambas orbitam ao meu redor, translação
e rotação. No fim são duas almas “sebosas” mesmo.
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