O Inconsciente do Olhar III
O futebol é a
carta de Caminha de nossa geografia.
A ponte Joaquim
Cardozo, arquitetura poética que leva em sua margem o elo entre o ferro e o
roedor, o Coque e os Coelhos, arqueia sobre o Rio Capibaribe embotado de
hospitais e palafitas. As margens deste e na cabeceira daquela no sentido subúrbio/centro
se encontra um campo de futebol improvisado em meio ao mangue, ou seria um
mangue improvisado em meio a um campo de futebol? Em suma, neste dia a segunda
opção foi a que prevaleceu.
No ônibus, pangeia de ilhas a
deriva em busca de uma janela, no sentido subúrbio/centro, ou seria da lama ao
caos? Enfim, neste dia todo o itinerário, a lama, o caos, o subúrbio, o centro,
o caranguejo, o gabiru resolveram fazer uma pequena pausa em deferência a
plasticidade do lance.
O motor a combustão queimando óleo
diesel na segunda marcha acelerava o coletivo e eu que estava em uma janela na
ala direita do ônibus, em uma posição mais privilegiada do que a de um outro
cara que se encontrava duas poltronas na minha frente, e que a esta altura já
estava com o pescoço todo retorcido para não perder o desfecho do lance: o
moleque matou a bola no peito, defronte a mim, e tal qual o Diamante Negro
armou o seu corpo como se fosse um chié andando devagar e o goleiro como um
aratu pra lá e pra cá prevendo a bicicletada que iria receber.
Aquele pescoço antes retorcido se
converteu em uma cabeça do lado de fora do coletivo com os olhos crispados a
gritar: que gol do carai!
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