Um dia na vida de um Homo Lattes Lattes

15.9.15 Cabotino 0 Comentarios


Um acadêmico deve organizar sua vida com retidão e atilamento.

Vejam a programação do meu dia a dia.

Acordo cedo. Meu despertador está programado para tocar, todos os dias, exceto às quartas-feiras, às 11h37m. Nas quartas, ele desperta às 11h23m.

Nunca deixo de fazer minhas refeições. Faço meu desjejum às 11h40m e termino-o às 11h43m. Alimento-me de maneira frugal para não ter futuras indigestões, e de maneira lenta (temo engasgar-me). No desjejum, alimento-me apenas de mingau de aveia acompanhado de iogurte grego, pois uma harmoniosa eliminação dos alimentos não interferirá em minhas inspirações à privada.

Às 12h20m percorro as pejadas prateleiras de minha biblioteca. No momento, faço prospecção para a feitura de um artigo sobre as crises cíclicas do capitalismo no debate entre os marxistas ocidentais.

Depois de ler duas laudas da Dialética Negativa (Adorno); cinco laudas de Americanismo e Fordismo (Gramsci) e mais meia lauda de O Discurso Filosófico da Modernidade (Habermas), eu tiro um cochilo em meu divã forrado com pele de lhama dos andes peruano.  

Meu despertador sobressalta-me às 14h40m. 

Às 15h00m minha empregada serve-me o almoço. Sou adepto da dieta macrobiótica. Balanceio minha alimentação no equilíbrio entre: sódio-potássio. Com o tempo, minha empregada aprendeu o equilíbrio entre os dois compostos químicos por meio de exaustivas aulas que lhe conferi sobre a dialética oriental do yin-yang (sódio-potássio).

Às 15h43m ponho a coleira em Debord (meu cachorro é um vira-lata espetacular, adotei-o por iniciativa de uma hastag: #viralataécordial que vi no Facebook) e saio para passear com ele. 

Minhas caminhadas com Debord são inspiradoras. Entre uma evacuação e uma excitação de Debord para qualquer cadela que passe na rua, eu penso na classe trabalhadora e no cada vez mais diminuto prazo para submeter meu artigo nos periódicos Qualis (Estrato A1) de minha área. 

Às 16h50m volto da caminhada revigorado.  Solto Debord e pratico um pouco de Sânscrito com um professor iraniano que mora em Calcutá. Conheci-o por meio do YouTube. Seu canal têm meia dúzia de pessoas inscritas. 

Às 17h00m navego pelo currículo Lattes de meus colegas de departamento e vejo quais são as suas mais recentes produções, e em quais periódicos eles publicaram. 

Às 17h13m olho a foto de Baudelaire pendurada na parede de meu escritório e reflito: to be Dandy or not to be Flaneur, that is the question. 

Às 17h21m, banho-me e em seguida faço um leve jantar à base de legumes. Geralmente uma sopa. Estou reduzindo minha alimentação, antes comia em pratos fundos, depois passei para os rasos, logo depois, para os de sobremesa e hoje como em um pires. 

Às 18h28m vou à universidade, de carro, ministrar minhas aulas. Neste semestre, estou lecionando uma eletiva intitulada, Problemas centrais na produção de imagens no século XXI: uma agenda pós-narcísica

A disciplina que conta com uma dúzia de alunos começa, britanicamente, às 19h15m. Os alunos geralmente chegam atrasados, em plena exibição dos vídeos que escolhi após exaustivo exercício heurístico. Ao acender as luzes, percebo que alguns deles se emocionaram com as imagens, pois seus olhos estão em rubra cintilação. 

Às 21h30m volto para casa. 

Às 21h40m retiro um cravo do rosto.

Às 21h45m ponho o pijama. Em seguida pego o meu regador de estanho, em formato de cisne, que comprei por $ 50,00 de um artesão/hippie em Fresno (Califórnia, EUA). Com ele, aguou minhas mudas de açafrão, cardamomo e anis estrelado ao som de Ravi Shankar.  

Às 22h10m escrevo dois parágrafos e meio do meio artigo.

Às 22h21m faço minha citação diária no Facebook. A de ontem foi: As ciências humanas na América Latina necessitam de uma rigorosa revolução metodológica. Não podemos continuar construindo teorias sociais progressistas, para uma agenda política contemporânea, com uma metodologia do século XIX. É preciso atualizar o método científico para além dos pólos: nomotético ou ideográfico. Caso contrário, padeceremos – ad nauseam – de um cacoete metodológico que só faz reproduzir as velhas estruturas do pensar/agir político tão característico do nosso continente.

Às 22h43m recolho-me exausto ao meu leito. Para embalar meu justo sono, geralmente escuto Kanne G em som ambiente. Durmo e sou despertado às 2h25m para tomar meu suco detox com uma cápsula de 50mg de ansiolítico. Depois volto a dormir.

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