MÃO DE OBRA

30.10.14 Cabotino 1 Comentarios


Dedicado a Sylvia Kristel, nossa eterna Emmanuelle,
para sempre nos destinos traçados de nossas mãos e corações.


Sou o Alexander Portnoy da masturbação.

Lembro-me das madrugadas de sábado em claro esperando com o “cu na mão”, porque a tevê preto e branco, quatorze polegadas da Philips, ficava na sala e, a qualquer momento, alguém poderia surgir e me pegar com a mão na massa – com Emmanuelle a mão era na consistência e não na consciência.

Contra o mal estar na civilização, só a masturbação.

Nos anos 1990, a punheta era algo sagrado. Desde as vídeos locadoras à crença de que punheta enchia a mão de cabelos (imaginem Tony Ramos se masturbando) “descabelar o palhaço” era algo feito na surdina, no miudinho e muitas vezes no escuro. O drama que era locar algum VHS pornô na locadora de Tonho, ali entre a rua 21 e 22, quando ele estava por lá era maior limpeza, mas quando estava sua esposa (dona Neta) ou sua filha, aí a coisa ficava séria. A vergonha de se esgueirar pelo estreito corredor dos pornôs com aquele manancial de Buttman, Brasileirinhas, Sexxxy era tamanha. Mas, éramos chatos e esperávamos Tonho voltar e corríamos para o abraço. Na locação de três fitas vinha uma grátis, certamente uma pornô. Nos finais de semana, a lógica invertia-se. Como dizíamos na época: “três pancadarias e um de bala”.

Hoje, vendo em retrospecto a nossa via crúcis para garimpar um VHS pornô, vejo que a punheta tornou-se um tédio. A disponibilidade da indústria pornô em vários suportes e dispositivos móveis gerou uma postura blasé em relação ao “matá-la na mão”. Qualquer menino de dez anos já possui uma cinegrafia pornográfica no celular e em Full HD! O tédio é tão grande que ouvi de um menino para quem eu dava aula particular dizer assim: “às vezes fico com o celular no banheiro e penso, bato ou não uma punheta hoje?”. Daí eu pensei, absurdo! Absurdo! Os smartphones e a internet profanaram a sagrada punhetinha. Não há mais imaginação, aquele lance visto na escola e salvo na memória para mais tarde, ou quem sabe, alguma bunda (pandeiro, rabo, cu, balde, abajur de buceta etc) secada na rua e depois no banheiro a pegada seria feérica – se acabar na mão como colher de pedreiro.

Aos quatorze, quinze anos... Os banhos eram demorados, os olhares para as professoras eram maliciosos (eita!). Vendo pelo retrovisor da história percebo que as punhetas de minha geração tinham uma deferência para as mulheres mais velhas. Havia uma palpabilidade com as revistinhas de sacanagem (quem não se lembra das picardias de Miguelito ou das histórias de Zefiro?) ou, as clássicas revistas Playboy e Sexy, a primeira com as musas da tevê, as do primeiro time: “Tiazinha, Feiticeira, as Sheylas etc.”, já a última tinha o segundo time: “dançarinas de banda de axé sem grande repercussão, musas da cultura pop etc.”, talvez, por conta da baixa exposição midiática de suas manequins de capa, a revista Sexy mostrasse um “nu ginecológico”. Por isso, as revistas Sexy eram as mais cobiçadas pelos punheteiros de plantão aqui do bairro, havia todo um circuito de trocas. Foda era pegar as revistas com as melhores páginas grudadas, os escrotos não tinha nem a decência de abaixar um pouquinho na hora “agá”, era foda...

Além das divas impressas no papel, havia a consideração pelas da tevê. Além da diva maior de todas, Emmanuelle, havia as nacionais que, com certeza, contribuíram para o aumento do índice pluviométrico da bacia do Rio Jaboatão. Entre elas: Sônia Braga, Cláudia Raia, Thereza Collor e outras. Conheço estas mulheres como a palma de minha mão.

Com a era digital houve uma crise de palpabilidade, de tactalidade com o papel das revistas em sua dupla acepção, e com a imaginação como um todo. Já falei sobre isso acima, mas vale a ratificação. Desta maneira, advogo mais imaginação e menos X-Vídeos porque tratando-se de punheta, vale a pena voltar à mão de obra e consagrá-la ao lugar de onde nunca deveria ter saído – o fetiche da fantasia.



Um comentário:

  1. Cabotino, você é um narrador benjaminiano. Muito rothiana sua prosa. Se garantiu.

    ResponderExcluir