de volta

27.2.14 Unknown 0 Comentarios


É crua a vida. Alça de tripa e metal.
Nela despenco: pedra mórula ferida.
É crua e dura a vida. Como um naco de víbora.
Como-a no livor da língua
Tinta, lavo-te os antebraços, Vida, lavo-me
No estreito-pouco
Do meu corpo, lavo as vigas dos ossos, minha vida
Tua unha plúmbea, meu casaco rosso.
E perambulamos de coturno pela rua
Rubras, góticas, altas de corpo e copos.
A vida é crua. Faminta como o bico dos corvos.
E pode ser tão generosa e mítica: arroio, lágrima
Olho d’água, bebida. A vida é líquida.
(Alcoólicas - I)

Talvez a notícia só tenha chegado, de fato, com uma semana de atraso. Embora soubesse, estranhamente, dela desde sempre. Sentiu falta da pilha de revistas que ficava ao lado do sofá; não notou a cama desarrumada como de costume; a carteira de cigarro não estava remexida - ninguém levantara durante a noite para fumar.


Os sete dias da semana foram suficientes para o feijão da geladeira estragar - a porção que era feita para dois sobrava vultuosamente. Os filmes de Tarantino não ocupavam mais a prateleira, nem os livros de contos de J. J. Veiga.

O vasto espaço da cama era agonia; o silêncio da casa, angústia. Chamava os amigos para festa; depois da bebedeira, o silêncio cada vez mais eloquente. O gato arranjou nova moradia, não suportou o insólito ambiente; até os cachorros cessaram o latido.

A luta contra o abuso do refrigerante, ao almoço, meu estranho jeito de dizer que me importo, também não acontecia mais. Seriam melancólicas e pieguíssimas saudades? Na dúvida, envio-lhe áudio com ríspido trecho de Alcóolicas, Hilda Hilst - meu estranho jeito de dizer que quero de volta.

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