Os ratos roeram a roupa do "Rei de Roma"

4.2.16 Cabotino 0 Comentarios


A megalomania recifense serve apenas para alimentar nosso provincianismo. Nos arvoramos de símbolos, produções culturais, ritmos musicais, ídolos de ontem e de hoje, lideranças carismáticas, políticos orgânicos e inorgânicos que nasceram, ou foram adotados por nós, para insuflar um ego telúrico que é até bonitinho, mas que não quer dizer nada.

Moramos em uma paróquia e nada vai nos demover do contrário. Dividimos até a mesma arquidiocese com Olinda. Nossa elite cabe numa cozinha, ora fazendo Bolo de Rolo, ora fazendo um Souza Leão.

O último exemplo de nossas vidas paroquiais foi o frisson, sobretudo no rádio, na tevê e também nas redes sociais – essas menos por serem mais pulverizadas – causado pelos trajes do treinador do Sport Clube do Recife, Paulo Roberto Falcão.

Foram duas semanas em que se falou apenas nos trajes, digamos assim, pouco ortodoxos para um treinador de futebol na "Terra dos Altos Coqueiros". Falou-se da bermuda que Falcão utilizou à beira do gramado, numa tórrida tarde sertaneja, na derrota do Sport frente ao Salgueiro, por um a zero, no estádio Cornélio de Barros. Comentou-se do chapéu Panamá que o treinador usou no amistoso contra o Argentino Junior, na camisa de botão florida etc., 

Ninguém falou que Falcão nasceu em Santa Catarina, mas morou sempre no Rio Grande Sul, e com passagens em lugares com clima mais auspicioso do que o nosso. Nenhuma viva’ alma teve o bom senso de relativizar os trajes do treinador em função de sua vida pregressa. Ou um cristão qualquer, na bairrista crônica esportiva local, para chamar atenção dos companheiros de estúdio e de emissora pra dizer: minha gente, vamos falar de futebol!

Ano passado, quando Falcão chegou à Ilha do Retiro, a impressa local foi a primeira a minar o trabalho dele. Alegaram que ele não fazia o perfil do Sport. E qual é o perfil do Sport, então? Ao cabo do Brasileirão, os números do treinador à frente do Sport só ficaram atrás do campeão Corinthians. Daí alegaram que ele pegou o time pronto de Eduardo Baptista, tudo bem, está correto. Agora esqueceram de dizer que Eduardo Baptista teve apenas 8 vitórias em quase 30 rodadas, Falcão teve 7 vitórias em 11 jogos.

À medida que as vitórias vinham no Brasileirão, Falcão questionado antes até de começar seu trabalho, começou a ser chamado de gentleman, fidalgo e outros adjetivos que vinham à tona, sobretudo após as coletivas de impressa. 

Agora, após a segunda rodada do Hexagonal do Título, do Campeonato Pernambucano, depois da segunda derrota consecutiva do Sport, dessa vez frente ao América-PE, a mesma impressa começou a questionar o trabalho de Falcão. Começaram a falar que ele não chega à Páscoa, quem dirá a junho. Pondo em xeque o trabalho do treinador após a segunda rodada.

E as críticas iniciais em tom de pilhéria começaram a surgir justamente do assunto mais alardeado por eles nas últimas semanas. Disseram que "Falcão está mais preocupado com o visual do que com o time", que "chapéu Panamá não entra em campo", que "os treinos fechados", que a desculpa da buzina de Tarcísio, folclórico torcedor do Salgueiro, era esfarrapada e que não redimia o fraco desempenho do Sport frente ao Carcará. Mas em nenhum momento Falcão pôs a culpa da derrota do seu time na conta da buzina do citado torcedor. Falou apenas que seu trabalho, à beira do campo, foi comprometido. Agora eu gostaria de ver você narrar um jogo, ou transmitir as informações à beira de campo, com alguém buzinando em seu ouvido. 

Nossa impressa é provinciana, sobretudo a esportiva, e é responsável por alimentar cada vez mais essa nossa postura paroquial frente ao diferente, ao incomum, ao cosmopolitismo. O rádio e a tevê ao invés de incentivarem a diferença e o pluralismo, ficam retroalimentado um bairrismo tacanho. 

Parece que a vinheta: “Pernambuco falando para o mundo” deveria ser alterada para: “Pernambuco falando para si mesmo”. E se é para falar de si mesmo, na resenha futebolística, que o assunto seja ao menos futebol, porque a roupa do "Rei de Roma" já está toda manjada do tanto que falam sobre ela.

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Crédito das fotos: Google Imagens

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