Dureza

27.3.15 Cabotino 0 Comentarios


O cabelo ainda molhado. A pele ainda carregando o cheiro de sabão de coco. Óculos escuros na cara. Calça jeans  preta com cinza. Cueca nova e apertada. O pau à esquerda. Camisa polo azul. Tênis running nos pés. Meias soquete. Mochila nas costas. A papelada do escritório dentro. Smartphone no bolso direito da calça. Fone nos ouvidos. “... Samba direitinho / pra cima e pra baixo virando os olhinhos...”. Direto nos tímpanos.

Ônibus lotado.

Uma senhora educada pede para segurar minha mochila, que de pronto lhe entrego e sinto o alívio imediato por deixar o meu trabalho momentaneamente no seu colo.

Seguro nas hastes do coletivo que traçam uma reta perpendicular entre as duas poltronas do corredor onde se encontra a diligente senhora.

O conforto propiciado por ter tirado a mochila das costas é interrompido por um cabuloso filete de suor que começa a deslizar pela calha de minha coluna vertebral.

Uma chuvinha fora de hora começa a cair sobre o coletivo e ato contínuo as janelas são fechadas, pois os passageiros não admitem a ideia da chuva embotar seus perfumes.

De chofre.

Uma “felina” entra no coletivo com um vestidinho de tigresa e as pernas trigueiras, cheia de adjetivos.

Suas ancas eram tão anchas que ela rodou a catraca de lado e por um árdil seu vestido foi levemente suspenso, o que fez surgir da perna direita a tatoo de uma ascendente roseira.

Súbito.

Um volume começou a latejar do lado esquerdo de minha cueca.

A vida brota em ocasiões inimagináveis e o volume queria alcançar o ápice daquela roseira, só que ao invés do livre despertar encontrou uma resistente teia “espinhosa” de tecido.

O que fazer quando o seu pau é de esquerda?

Canhoto e sem jeito, como coração que lhe bombeia sangue para todas formas belas e para todas as flores ávidas por um toque para desabrocharem umidamente.

Que dureza.

0 comentários: