Eu escolhi reificar
Imagina
uma compositora-cineasta chegando à casa dos trinta, em pleno processo criativo.
Ela é branca, inteligente, hétero, esbelta, rica, mora na zona sul... enfim, possui todos os capitais - econômico e simbólico - à sua disposição. Essa artista decide produzir uma música-clipe que pretende radicalizar a linguagem de sua
matéria-prima, e advinha o que ela escolhe: intercambiar imagens de nu frontal
com uma música insossa repleta de oxítonas tarimbadas.
Eis
o padrão artístico da tal compositora-cineasta: compor uma canção-clipe nos
moldes de sua biografia – linear, modorrenta, tonal, segura, enquadrada e com
algumas miçangas ideológicas, evidentemente, pré-fabricadas.
O
furor causado pelo clipe-música “Eu escolhi você” só poderia ganhar volume numa
sociedade como a brasileira em que, imagens de nu frontal tornaram-se sinônimos
de crítica à ordem de coisas instituídas. O debate cultural brasileiro
tornou-se, nestes dias, uma nota-de-rodapé de genitálias desentumecidas.
Lamentável.
Não
tem como não bocejar ao ver e ouvir “Eu escolhi você”. A quantidade de nus
burocráticos saltam aos olhos: genitálias sem nenhuma excitação e sem nenhuma
heterogeneidade no tocante às cores. E o curioso é que o aparelho vibrador,
parábola derradeiramente clichê que nos remete ao título da canção, é a única coisa que pulsa,
que tem vida em todo clipe-canção.
Mas
ao cabo, o clipe-canção consegue atingir seu objetivo: reificar as genitálias e
animar “consolos”. Critica-se a reificação que o outro nos empreende, nos
relacionamentos, apelando para a própria reificação do outro como saída final.
E assim fecha-se o circuito binário da objetificação do outro.
E esse circuito é caro à cena "indie" brasileira pois a alteridade - um dos pilares centrais da canção produzida no Brasil - abre espaço para um hedonismo acachapante. E o hedonismo é a mais pura tradução da reificação de tudo.
E esse circuito é caro à cena "indie" brasileira pois a alteridade - um dos pilares centrais da canção produzida no Brasil - abre espaço para um hedonismo acachapante. E o hedonismo é a mais pura tradução da reificação de tudo.
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