Comentários a respeito de Ulisses

10.6.16 Castanha 0 Comentarios


Faz seis meses e dezenove dias que Ulisses abandonou o ventre de sua mãe, Sandra Luíza, que eu carinhosamente chamo de Lú, para se aventurar aqui fora. Acredito que veio a contragosto, pois alguém em sã consciência não abandonaria o conforto das entranhas maternas para viver nesse mundo de dinheiros e cifrões, onde as pessoas são destratadas. Se ele tem uma cabeça boa, uma consciência sóbria para usar nas decisões, isso saberei com o tempo; essas coisas a gente não sabe assim, tão no começo. Por hora, Ulisses anda bem da saúde, apesar de recentemente estar gripado. Está firme e forte, sorridente, atento ao que lhe cerca e com bom apetite. Quando a mãe de Ulisses, Lú, o carregava no útero, eu não fazia ideia de como ele seria e tampouco me empenhei em imaginar. Esperei que ele nascesse para ver seu rosto e lhe conhecer. Fiz isso pra evitar qualquer idealização de meu filho. Queria viver com o que ele era de fato e não com o que eu poderia querer que ele fosse. Agora, olhando para ele, bonito, saudável e forte ao meu lado, ou nos meus braços, tento repetir a negação de “como será”; assim como fiz ao longo da gestação dele, o futuro deve permanecer em aberto. Pode ser que ele faça as coisas que fiz, de forma muito parecida ou diversa. Ou pode ser que ele queira fazer o oposto: queira ficar sóbrio ao em vez de se entorpecer, queira acreditar em deus ao em vez de ser ateu, talvez seja insensível ao sofrimento dos outros; talvez, mas espero que não... Bem, de todo jeito, seja lá quem esteja lendo essa crônica, onde e quando estiver lendo, saiba que agora, pelo menos agora, estou empenhado em pensar que Ulisses, desde o começo, terá uma boa margem de liberdade. Uma margem e tanto. Espero não mudar de ideia, espero de verdade! E você, Ulisses, se estiver lendo essa crônica agora, anos depois dela ter sido escrita, saiba que o título dela não e à toa. Ele é baseado numa canção chamada “Comentários a respeito de John”, cantada por um sujeito chamado Belchior. Assim como a personagem dessa canção não quer ninguém em seu caminho lhe indicando o que fazer, desejo que seu espírito seja igualmente livre. E que seu coração bata onde nasce o sol, assim você terá certeza de que no horizonte há algo que buscar. Na caminhada em direção ao horizonte, você entenderá que o fato dele ser inalcançável não torna inúteis os passos que o buscam, pois é justamente aí, no percurso, que descobrimos o sentido das coisas.       


Castanha 10 de junho de 2016

0 comentários: