A Calcinha da Virada

27.12.10 Foi Hoje! 5 Comentarios


Numa das quintas-feiras do tumultuado mês de dezembro eu fui perambular pelas ruas do centro de Recife à procura de uma camiseta para passar as festividades de Natal com a família. Tarefa árdua, eu sei, caminhar debaixo daquele sol incessante e no meio de tanta gente, trombada aqui, pisão no pé ali, não é para qualquer desavisado.
Mas é que minha pequena, dias antes, havia me ralhado às vestimentas. Abrindo o meu humilde guarda-roupa, exclamando em voz alta, e orgulhando o bom e velho Pasquale, ela disse: ”Só tens farrapos neste guarda-fatos!”. Ora, ora, Minha Pequena, disse eu, semana que vem eu resolvo isso, esquece, deixa pra lá.
Disse e cumpri. Na semana que se sucedeu, lá estava eu, enfrentado uma fila dos diabos para pagar uma peça de roupa que custava R$ 19,90. Efetuada a compra eu saio pingando de suor e vou tomar, ali perto, algo para matar a sede, quando escuto, ao meu lado, uma conversa bem peculiar numa mesa com quatro ou cinco moças.
Ora, ora, não me censure a indiscrição. Um aspirante a cronista tem sempre que estar de ouvidos atentos às mesas adjacentes. Mas, sim, as moças, elas estavam conversando sobre ‘a calcinha da virada’. Que grata surpresa, eu já tinha me esquecido que em épocas de ano velho as fêmeas se põem místicas e supersticiosas. Uma delas introduz o tema:

- Meninas, qual é a cor da calcinha que vocês vão passar a virada de ano?!
- Eu vou passar de vermelho, o ano que vem eu quero intensas turbulências na minha vida.

Bacana, ‘intensas turbulências’. Adorei o eufemismo para grandes farras & phodas homéricas. A outra, que estava logo ao meu lado esquerdo, continuou:

- Eu vou de calcinha amarela, menina, não agüento mais esse liseu.

- Eu vou de branca, chega de aperreio na minha vida. – disse outra.
A última, para surpresa de todas, disse:
- Eu vou usar calcinha preta... Minha perseguida está fechada para balanço.
- Menina, Saulo – devia ser o nome do canalha- não é o último homem do mundo não! – reagiu uma.
- Mas foi o último do ano. – replicou a garota.

A conversa seguiu com um sem número de sugestões de cores e significados. E eu me pus a comparar mulheres e homens; onde últimos, no varejão de pequenas crendices, perdem de lavada para as fêmeas: são sempre práticos e objetivos. Na fila da já citada loja, me lembro de ter ouvido uma mulher implorar ao seu marido para pular as tais sete ondinhas no réveillon. ‘Vamo, amor, por favor, tu nunca fizesse isso!’, dizia ela. ‘Ouxi, vou nada!’, respondia impaciente o coroa.
Ou, talvez, essa história de diferentes cores de calcinha para o ano novo, poderia não ser crendice alguma, superstição alguma, mas só um pretexto para comprar lingerie nova. Mesmo assim, ainda seria bela forma de hipotecar desejos e vontades.
Já passava da hora de ir embora, mas me deixei ficar por ali, ébrio de contentamento, me deixando colorir com as calcinhas daquelas que sonham libidinosamente com ano melhor.

Rosano Jr

5 comentários:

  1. Muito bom Rosano. O final de ano vem carregado de sonhos, aborrecimentos e tantas outras coisas. Valeu cara!

    Castanha

    ResponderExcluir
  2. Boa, velho canalha!
    Calcinhas desejos e muitos planos.
    Mas fala a verdade, pular ondinha é phoda kkk
    flowsss

    rico santana

    ResponderExcluir
  3. É isso aí meu caro camarada, você está me saindo um ótimo tatu da alma e do estrôgeno feminino, um Oscar Wilde às avessas da rua do Hospício a vodka delirante da Torre Malakoff. E agora com nova alcunha: Jr, que soa mais vacilante, apenas soa.

    Renato

    ResponderExcluir
  4. crendice ou não, a minha é rosa (com algum detalhe vermelho...) ha alguns anos.

    se tudo continuar lindo como está, relacionamento estável, sem grandes emoções...prometo que este ano eu mudo para o vermelho da cabeça aos pés!

    ResponderExcluir
  5. grande rosano junior, se garantiu, parcêro.

    ResponderExcluir