Quando é e quando quase foi
Faz
pouco mais de uma hora que eu quase bati com o carro em outro carro. Quase. Se
tivesse batido, não estaria aqui dizendo que quase bati, estaria afirmando: bati!
Faltou pouco, tão pouco que nem parece que faltou: vinte centímetros, trinta
centímetro, quarenta centímetros... Quando fui estacionar aqui no condomínio,
comentei isso, pra desabafar com a vizinha que estava de saída, mas antes fez a
gentileza de me ajudar a fechar o portão, ela disse: um tempo atrás eu bati com
meu carro nesse mesmo lugar em que você quase bateu. Ela não teve a mesma
sorte, não pode dizer: foi quase!
O
quase não está por aí de vez em quando, está sempre: ou quase foi ou não foi
quase porque já foi. A história humana se desenrola assim: E se os portugueses
não iniciassem as grandes navegações? E se os alemães tivessem ganhado a
guerra? E se os militares brasileiros não tivessem dado o golpe de 64? Bem!
Todas essas coisas foram e também quase não foram. Se fossem apenas “quase”,
então não teriam “sido” também.
E
se eu não tivesse sido o primeiro espermatozóide a chegar à fecundação? Eu nem
teria tido a chance de me perguntar sobre isso, assim como as outras dezenas de
milhares de espermatozóides, minhas irmãs e irmãos não tiveram. A mesma regra
vale pra vocês, amiga leitora e amigo leitor. E se eu tivesse estudado economia
em vez de ciências sociais? Não teria conhecido amigos que gostam de literatura
e que me incentivaram a escrever? Ou teria, pois eu já gostava de literatura! Então,
eu quase não virei cronista? Ou quase virei economista? Ou quase virei cronista
e economista? Ou quase virei neoliberal? Quem sabe! O que sei é que virei o “ser
que quase não fui” enquanto “quase não fui o que sou”. Seria melhor se fosse de
outro jeito? Não sei, pois teria que ser o que sou e também o que não sou para
comparar e ser e não ser ao mesmo tempo é impossível. Entenderam amigas e
amigos leitores? E vocês? São ou quase foram? Quem sabe? A gente não se
pergunta o tempo todo sobre isso. Mas, a gente deveria se perguntar. Ou será
que não? Se a gente se perguntasse, teria mais respostas? Ou teria mais
dúvidas, já que não saberíamos como seria? Saberíamos apenas como quase seria?
Vai saber...
Castanha 16/05/2013
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